IP, 10/03/2025
Membros da pequena comunidade cristã na costa da Síria estão vivendo com medo depois que ataques mataram mais de 1.000 civis, a maioria alauítas, com relatos de cristãos também sendo atingidos pela violência.
"O atual conflito na Síria não me diz respeito, mas somos suas vítimas", disse Ruwayda, uma cristã de 36 anos da cidade portuária de Latakia.
"Há uma sensação de que ninguém está nos protegendo", disse ela à AFP.
"Sinto um misto de medo e apreensão pelo que está por vir na Síria, mas tenho certeza de que a migração é a única opção", acrescentou.
A onda de violência — a pior desde que o ex-presidente Bashar al-Assad foi deposto em dezembro — eclodiu na quinta-feira na região costeira, reduto dos alauítas.
Começou com confrontos entre homens armados leais a Assad e as novas forças de segurança do país.
O que se seguiu foi descrito como um "massacre", no qual membros da minoria alauíta de Assad foram alvos.
O Observatório Sírio para os Direitos Humanos informou que pelo menos 1.068 civis — a grande maioria alauítas — foram mortos pelas forças de segurança e grupos aliados.
Houve relatos de cristãos sendo pegos no fogo cruzado.
Em um sermão no domingo, o Patriarca Ortodoxo Grego de Antioquia, João X, declarou que "muitos cristãos inocentes também foram mortos" ao lado dos alauítas.
Obituários para vários membros da pequena comunidade cristã da costa foram compartilhados nas redes sociais.
A AFP conseguiu confirmar pelo menos sete dessas mortes, incluindo um homem e seu filho, que, segundo um conhecido, foram baleados a caminho de Latakia.
Outros quatro membros de uma mesma família foram mortos em sua casa, em um bairro de maioria alauíta da cidade. O pai de um padre também foi assassinado em Baniyas, mais ao sul, segundo parentes e igrejas.
Vídeos nas redes sociais também espalharam pânico, incluindo um em que um combatente, falando em um dialeto árabe não sírio, ameaça cristãos e alauítas.
Um residente cristão de Latakia, que falou sob condição de anonimato por medo de represálias, disse que ele e seus vizinhos "estão trancados em casa desde o início da escalada, temendo que combatentes estrangeiros possam invadir".
Todos os cristãos que falaram com a AFP recusaram-se a revelar seus nomes reais por motivos de segurança.
Muitos dos combatentes que lançaram os ataques desde quinta-feira não eram da Síria, segundo diversos relatos.
O analista Fabrice Balanche disse que, antes da guerra começar em 2011, a Síria tinha cerca de um milhão de cristãos, ou cerca de 5% da população.
Esse número encolheu para cerca de 300.000 depois que a maioria fugiu durante a guerra civil, acrescentou ele.
Apesar dos esforços do presidente interino e do governo para acalmar os temores, as diversas minorias da Síria, incluindo os cristãos, estão tomadas pelo medo desde que as autoridades sunitas assumiram o poder em dezembro.
O presidente interino Ahmed al-Sharaa liderou o grupo Hayat Tahrir al-Sham (HTS), que comandou a ofensiva que derrubou Assad.
O HTS foi (e ainda é) um braço da Al-Qaeda na Síria e continua classificado como organização terrorista por governos ocidentais, incluindo os Estados Unidos.
Na segunda-feira, um sentimento de relativa normalidade retornou a Latakia, enquanto forças de segurança erguiam pontos de controle nos bairros de maioria alauíta, segundo um correspondente da AFP.
Nos distritos sunitas e cristãos, a atividade parecia quase normal, mas sem o movimento habitual.
"Estamos muito ansiosos. Os rostos das pessoas estão pálidos de medo", disse Heba, uma professora cristã que usou um pseudônimo para proteger sua identidade.
"Não sabemos o que o futuro nos reserva", afirmou a mulher de 40 anos.
Ela observou que, embora os cristãos não tenham sido diretamente alvejados como os alauítas, muitos foram mortos no fogo cruzado.
No sábado, pastores de igrejas em Latakia divulgaram um comunicado conjunto pedindo aos moradores "que não se deixem levar por rumores".
O comunicado visava enviar uma "mensagem de tranquilidade" após os pastores se reunirem com "uma delegação da liderança do departamento de segurança".
No domingo, Sharaa prometeu "responsabilizar, com firmeza e sem complacência, qualquer um que tenha participado do derramamento de sangue de civis... ou que tenha ultrapassado os limites do Estado".
Mas moradores como Gabriel, de 37 anos, disseram que isso não bastou para aliviar seus temores.
"Não me sinto seguro quanto ao meu futuro e não tenho coragem de me casar e ter filhos neste lugar", afirmou.
"Há dez anos, tive a chance de emigrar para o Canadá, mas apostei que a situação melhoraria.
"Hoje, me arrependo de não ter aproveitado essa oportunidade."
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Fonte:https://insiderpaper.com/fear-among-syrian-christians-after-deadly-attacks/
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