Um ponto de virada ocorreu na vida da espécie humana. A sustentabilidade da instituição mais antiga da humanidade — a fonte de fertilidade, proteção, nutrição e capital humano — é agora uma questão aberta. Com base nas tendências atuais, estamos diante de um mundo em que a população está envelhecendo e diminuindo rapidamente, com poucas crianças — muitas das quais não usufruem do benefício de terem irmãos e de crescerem em um lar com pai e mãe — de idosos solitários vivendo com uma parca aposentadoria e de estagnação cultural e econômica.
Em quase todos os países desenvolvidos, incluindo a maior parte da Europa e da Ásia Oriental e em muitos países das Américas — desde o Canadá até o Chile, as taxas de crescimento demográfico caíram para níveis abaixo do necessário para evitar o rápido envelhecimento e declínio populacional (veja a Figura 1). A mulher mediana em um país desenvolvido tem hoje apenas 1,66 filhos durante toda sua vida, o que é aproximadamente 21% abaixo do nível necessário para manter a população ao longo do tempo (2,1 filhos por mulher). Consequentemente, o número de crianças com idade de 0 a 14 anos é 60,6 milhões a menos no mundo desenvolvido hoje do que era em 1965. [2]. Devido principalmente à diminuição na quantidade de crianças, os países desenvolvidos enfrentam forças de trabalho cada vez menores, ao mesmo tempo que precisam atender ao desafio de sustentarem uma população de idosos que cresce rapidamente.
Em anos recentes, o fenômeno da fertilidade abaixo do nível de reposição populacional se propagou para muitos países menos desenvolvidos. Na verdade, o número de filhos vivos por mulher caiu em uma única geração de seis para menos de dois em países tão diversos como Irã, Líbano, Tunísia, Chile, Cuba, Trinidad e Tobago, Tailândia, China, Taiwan e Coreia do Sul. [3].
A população mundial ainda está crescendo e as Nações Unidas projetam que a população mundial poderá aumentar de 7 para 10 bilhões nos próximos 90 anos. [4]. Mas, este é um tipo diferente de crescimento daquele que vimos antes. Até bem recentemente, o crescimento populacional ocorria principalmente com o aumento no número de crianças e jovens.
Entretanto, ao longo dos próximos 40 anos, de acordo com as projeções mais recentes da ONU, 53% do crescimento da população mundial virá do aumento no número de pessoas com mais de 60 anos, enquanto que apenas 7% virá de pessoas com menos de 30 anos. De fato, a ONU projeta que por volta de 2025, a população de crianças com menos de 5 anos, já em declínio na maioria dos países desenvolvidos, cairá globalmente também (veja a Figura 2). [5]. Isto significa que a população mundial poderá começar a cair por volta da virada do século, especialmente se as taxas de natalidade não interromperem sua tendência de queda.
Acompanhando a megatendência global da queda nas taxas de natalidade, existe uma mudança radical nas circunstâncias em que muitas crianças crescem, pois em um país após o outro está ocorrendo um crescimento no número de divórcios e/ou de nascimentos fora do vínculo de um casamento, além de uma queda brutal na porcentagem de crianças que vivem com pai e mãe casados. Em uma grande parte da Europa e nas Américas, da Grã-Bretanha até os Estados Unidos, do México até à Suécia, os nascimentos fora de uma união estável sob os vínculos de um matrimônio são agora a "nova normalidade", com 40% ou mais de todas as crianças nascendo de mães solteiras. (Veja a Figura 3). Embora muitos desses bebês tenham pais que coabitam juntos, as famílias formadas por casais que coabitam são significativamente menos estáveis do que aquelas formadas por casais casados. Isto significa que as crianças nascidas fora do casamento estarão marcadamente mais expostas a dependerem dos cuidados de um número maior de adultos responsáveis e às dificuldades enfrentadas pelos pais e mães solteiros, em comparação com os filhos de casais casados.
Considere o caso dos Estados Unidos. Um total de 41% das crianças americanas está agora nascendo fora do casamento. Aproximadamente a metade dessas crianças nasce de casais que coabitam e cerca de metade nasce de mães solteiras. [6]. Ambos esses grupos têm uma maior probabilidade de ficarem expostos à instabilidade (quando um pai deixa o lar, ou um novo pai social chega ao lar — as duas coisas são estressantes para as crianças) e à deficiência da criação por mãe/pai solteiro do que os filhos nascidos de pais casados. Um estudo envolvendo crianças nos EUA descobriu que 17% das que eram filhas de casais casados, 57% das que eram filhas de mães solteiras e 63% das que eram filhas de pais que coabitavam experimentavam algum tipo de instabilidade nos primeiros seis anos de vida. [7]. Outro estudo descobriu que a porcentagem de crianças em lares de mães/pais solteiros nos EUA mais do que dobrou, passando de 12% em 1970 para 25% em 2009. [8].
Considere agora a Suécia, onde 55% das crianças nascem fora de lares constituídos por um casamento. A vasta maioria dessas crianças nasce de pais que coabitam. Entretanto, até mesmo na Suécia, em que a coabitação recebe ampla aceitação social e suporte legal, as famílias que coabitam são menos estáveis do que as famílias de casais casados. Um estudo recente descobriu que as crianças nascidas de casais que coabitam tinham uma probabilidade 75% maior de verem seus pais separados até atingirem os 15 anos. [9]. Além disso, a porcentagem de lares com mãe/pai solteiro na Suécia quase dobrou nos últimos 25 anos, indo de 11% em 1985 para 19% em 2008. [10].
Uma vasta literatura sobre ciências sociais, bem como o senso comum, suportam a afirmação que as crianças se desenvolvem muito melhor e se tornam adultos mais produtivos, quando são criadas em lares estáveis e com pais casados. Sabemos, por exemplo, que as crianças nos EUA que são criadas fora de um lar intacto e constituído por um casal casado, são de 2 a 3 vezes mais propensas a sofrerem de problemas sociais e psicológicos, como delinquência, depressão e desistência da escola de nível médio. É também marcadamente menos provável que elas ingressem em um curso universitário e consigam estabilidade no emprego como adultos. [11]. O sociólogo Paul Amato estima que se os EUA usufruíssem hoje do mesmo nível de estabilidade familiar que possuíam em 1960, a nação teria 750.000 crianças a menos repetindo de ano, 1,2 milhão menos suspensões na escola, aproximadamente 500.000 menos atos de delinquência juvenil, cerca de 600.000 crianças a menos precisando receber terapia e aproximadamente 70.000 menos tentativas de suicídio a cada ano. [12]. Na Suécia, mesmo após os ajustes para compensar outros fatores, as crianças que vivem em famílias de mães/pais solteiros têm uma probabilidade no mínimo 50% maior de sofrerem com problemas psicológicos, de se viciarem em drogas e álcool, de tentarem ou cometerem suicídio do que as crianças que nascem em famílias com pai e mãe. [13].
Portanto, não é apenas a quantidade de crianças que está em declínio em um número cada vez maior de regiões do mundo, mas também a qualidade de suas vidas familiares, o que coloca em questão a sustentabilidade da família humana. Famílias sustentáveis não apenas se reproduzem; elas também criam a próxima geração com as virtudes necessárias e o capital humano para que as crianças floresçam e se transformem em adultos, cidadãos, trabalhadores e consumidores. As famílias intactas e formadas por casais casados são aquelas que têm a maior possibilidade de conseguirem educar com sucesso a próxima geração.
Quais são as causas e consequências, especialmente econômicas, do recente declínio na fertilidade e no número de casamentos? Qual é a resposta apropriada para aqueles que definem as políticas nos governos, líderes empresariais, sociedade civil e indivíduos? Estas questões foram tratadas na conferência acadêmica "Onde Está a Criança?", patrocinada pelo Instituto de Tendências Sociais, em Barcelona, Espanha, em 2010.
Este relatório investiga as evidências encontradas naquela conferência e em outros trabalhos acadêmicos relevantes, em uma tentativa de compreender a rápida evolução demográfica das sociedades modernas e sugerir opções para garantir a sustentabilidade delas.
O Futuro da Fertilidade nos EUA
Autor: Samuel Sturgeon
Embora a fertilidade na maioria dos países desenvolvidos tenha caído bem abaixo do nível de reposição, com Taxa de Fertilidade Total (TFR, de Total Fertility Rate) de 2,1 filhos por mulher, os EUA estão claramente fora do padrão. Durante a maior parte dos últimos 40 anos, a taxa total de fertilidade nos EUA pairou ligeiramente abaixo do nível de reposição. Durante esse período de tempo, cerca de 25% da mudança na TFR de um ano para o próximo pode ser atribuído às mudanças nas economia. Devido aos efeitos ainda residuais da Grande Recessão, espera-se que a TFR nos EUA permaneça abaixo de 2.0 durante os próximos anos. Olhando para os próximos quinze anos, a Figura A1 projeta como a TFR nos EUA poderá ficar dentro de três cenários econômicos diferentes: uma rápida recuperação econômica, uma lenta recuperação econômica e sem qualquer recuperação econômica.
Uma razão por que a taxa de fertilidade permaneceu e deve permanecer comparativamente elevada é porque a sociedade americana continua a valorizar as famílias relativamente grandes, pelo menos para os padrões do mundo desenvolvido. Especificamente ao longo dos últimos 40 anos, houve uma mudança muito pequena naquilo que a maioria dos americanos em idade fértil e em boas condições de ter filhos (18-46) considera ser o tamanho da família ideal. [2]. Cerca de 75% dos adultos americanos nessa faixa etária acredita que 2 ou 3 filhos sejam o ideal. O tamanho ideal médio reportado ao longo dos últimos 40 anos permaneceu praticamente estável, pairando em torno de 2,5 filhos, com um pico de 2,73 em 1970-1974 e um mínimo de 2,39 no período de 1995-1999 (veja a Figura A2). Em 2010, o tamanho ideal da família era 2,66 para os americanos adultos na faixa de 18-46 anos. Essas tendências culturais sugerem que a fertilidade nos EUA retornará aos níveis de reposição quando a economia se recuperar da crise atual e as pessoas se sentirem mais livres para seguirem seus ideais de fecundidade.
1. As três projeções estão baseadas em modelos que usam os seguintes padrões econômicos hipotéticos: Recuperação rápida: a taxa de desemprego cai para 5% por volta de 2012 e permanece nesse nível até 2015. O indicador Consumer Sentiment Index sobe acima de 100 por volta de 2012 e permanece acima de 100 até o fim de 2025. Recuperação lenta: o desemprego cai meio ponto porcentual a cada ano até 2019, quando atinge 5% e permanece nesse nível até 2025. O indicador Consumer Sentiment Index experimenta uma elevação lenta similar antes de atingir 100 no ano de 2020. Sem recuperação: a taxa de desemprego permanece em 9% até 2025 e o indicador Consumer Sentiment Index permanece em torno de 70.
2. Kellie J. Hagewen and S. Philip Morgan, "Intended and Ideal Family Size in the United States, 1970–2002", Population and Development Review 31 (2005): 507–527.
Causas da Queda da Fertilidade e no Número de Casamentos
A urbanização é o principal fator na transformação da demografia global. Hoje, mais da metade da população mundial vive nas áreas urbanas; em 1950, somente 29% da população mundial era urbana. [14].
Esta tendência tem impacto no comportamento reprodutivo humano. Para os residentes em cidades, sejam ricos ou pobres, o custo econômico da criação de filhos é considerável. Em um passado não tão distante, quando a maioria da população ainda era constituída por pequenos fazendeiros e sitiantes, a maior parte das crianças podia exercer um papel útil economicamente. Elas podiam ajudar a cuidar dos animais e das plantações, levar recados e realizar tarefas no lar, que foram agora em grande parte suplantados pelos alimentos e vestuário comprados nas lojas e pelos eletrodomésticos modernos. Entretanto, em um ambiente urbano, as crianças não são mais um ativo econômico para seus pais, mas um passivo (facilmente evitável ou adiável) que acarreta muitas despesas. [15].
Sem dúvida, os salários reais declinantes e a insegurança na duração dos contratos de trabalho têm uma grande influência nas conclusões de muitos jovens casais que eles devem evitar filhos, ou adiar o casamento e a construção de uma família. Em um trabalho acadêmico apresentado na conferência do Instituto das Tendências Sociais, os demógrafos Wolfgang Lutz, Stuart Basten e Erich Striessnig observaram que ao longo da última geração no mundo desenvolvido, especialmente na Europa, a entrada na vida profissional após os anos de formação educacional se tornou cada vez mais difícil. "Em muitos países europeus, onde jovens funcionários no passado ocupavam cargos que eram mais ou menos permanentes, hoje muitos têm de pular de um emprego temporário para outro." Nessas condições, torna-se menos atraente constituir família e, subsequentemente, deixar de dedicar todo seu tempo e energia para seguir uma carreira profissional." [16].
O Futuro da Criação de Filhos Fora do Casamento nos EUA
Ao longo dos últimos quarenta anos nos EUA, criar filhos fora de um lar constituído por um casamento cresceu quase que de forma linear. Essa tendência provavelmente continuará no futuro próximo (veja a Figura B1). Uma razão por que a porcentagem de filhos nascidos de mães solteiras provavelmente crescerá é que a idade média da mulher no primeiro casamento está superando a idade média ao ter o primeiro filho (veja a Figura B2). [3]. Isto significa que uma porcentagem crescente de mulheres nos EUA está se casando depois, não antes, de ter seu primeiro filho.
Desde 1970, a idade média no primeiro casamento subiu mais do que cinco anos, enquanto que a idade média ao ter o primeiro filho subiu menos do que quatro anos. Como resultado, a partir do início dos anos 1990s, a idade média ao dar à luz pela primeira vez era inferior à idade média no primeiro casamento. A taxa diferencial de aumento entre essas duas tendências explica parcialmente o crescimento na porcentagem de filhos que nascem de mães ainda solteiras. Por exemplo, em 2008, 40,6% de todos os nascimentos foram de mulheres solteiras; entretanto, o número para o primeiro nascimento era 48%. [4]. A Figura B1 contém uma estimativa de como a porcentagem de crianças nascidas de mães solteiras poderá estar até 2025 se a idade média ao ter o primeiro filho e a idade média ao se casar pela primeira vez continuarem a aumentar na mesma velocidade que nos últimos quarenta anos. De acordo com esse modelo, em algum momento por volta de 2023, metade de todas as crianças que nascerem nos EUA serão filhas de mães solteiras.
3. O Departamento do Censo dos EUA calcula a idade mediana no primeiro casamento como parte da Pesquisa Populacional Atual. A idade mediana no primeiro casamento para os anos de 1970-2010 foi extraída da seguinte tabela: http://www.census.gov/population/socdemo/hh-fam/ms2.pdf. A idade média da mãe ao dar à luz pela primeira vez para o período de 1970-2008 vem dos Relatórios de Estatísticas Nacionais Vitais, publicados pelo Centro Nacional de Estatísticas da Saúde.
4. Derivado pela Demographic Intelligence a partir do Sistema de Estatísticas Nacionais Vitais.
Enquanto isso, a crescente demanda por educação nas economias urbanas e modernas também desencoraja a fecundidade. Nas sociedades avançadas do mundo atual, um diploma de nível superior se tornou quase que um pré-requisito para a maioria das pessoas conseguir um salário que propicie boas condições de vida. Além disso, muitas pessoas ainda não concluíram seus anos de estudo formal antes que sua própria fertilidade biológica, ou a de seu cônjuge, entre em declínio. Mesmo que um jovem casal consiga iniciar uma família, as mesmas tendências de elevação no custo e na duração da educação os farão se revirar para descobrir como conseguirão arcar com o custo de dar aos filhos a educação mínima exigida nos mercados de trabalho do século 21.
Finalmente, embora os sistemas de seguridade social em todo o mundo, bem como os planos de previdência privada, dependam criticamente do capital humano criado pelos pais, eles paradoxalmente fornecem incentivos para permanecer sem filhos ou para limitar o tamanho da família. Em economias avançadas, os cidadãos não precisam mais ter filhos ou criá-los de forma bem-sucedida para garantir suporte na velhice. Em vez disso, os idosos nos países desenvolvidos conseguem depender dos benefícios na área da saúde e benefícios de aposentadoria pagos pelos filhos das outras pessoas, isto é, de adultos em idade produtiva que estão atualmente pagando seus impostos e contribuições para o sistema de previdência pública. [17].
O Futuro da Fertilidade Chilena
A taxa total de fertilidade (TFR) no Chile caiu acentuadamente ao longo dos últimos quarenta anos, de 3,4 para 1,9 filhos por mulher (veja a Figura C1). [5]. Parte do declínio deve-se ao maior desenvolvimento e à urbanização, que encarece a criação de filhos. [6]. Outros fatores possíveis incluem o declínio na participação religiosa e da influência da Igreja Católica [7], um maior individualismo, bem como o aumento na participação da mulher no mercado de trabalho e a dificuldade que algumas mulheres chilenas têm de combinar trabalho com família. [8]. Por causa dessas tendências principais, flutuações anuais na economia não parecem ter um papel forte na taxa total de fertilidade no Chile, como tem nos EUA; entretanto, as condições econômicas ainda parecem ter certo impacto. A Figura C1 projeta como a TFR poderá ficar no Chile em três cenários de recuperação econômica diferentes à luz da recente recessão econômica mundial: rápida recuperação econômica, lenta recuperação econômica e sem recuperação econômica. [9]
5. A taxa total de fertilidade para os anos 1970-2008 veio de Jorge Rodríguez Vignoli a Maria Chiara di Cesare, "Reproducción adolescente y desigualdades en Chile: tendencias, determinantes y opciones de política", Revista de Sociología 23 (2010): págs. 39–65.
6. John Bryant, "Theories of Fertility Decline and the Evidence from Development Indicators", Population and Development Review 33 (2007): págs. 101–127.
7. Carla Lehman Scassi-Buffa, "Chile: Un País Católico?", Centro de Estudios Publicos: Puntos de Referencia No. 249 (2001).
8. Lin Lean Lim, "Female Labour-Force Participation", em Completing the Fertility Transition, Population Bulletin of the United Nations, Edição Especial Nos. 48/49 (2009): págs. 195–212.
9. A TFR foi modelada usando-se a taxa anual de desemprego extraída do banco de dados do Banco Mundial para os anos de 1981-2008. http://data.worldbank.org/country.
Os padrões econômicos hipotéticos nos três cenários diferentes são similares àqueles usados para prever a TFR nos EUA na Figura A1.
Samuel Sturgeon, Ph. D., é diretor de pesquisa na Demographic Intelligence, que fornece projeções sobre a fertilidade e análises demográficas para empresas que fabricam produtos para o público jovem, produtos para o lar e indústrias farmacêuticas.
O Papel da Cultura
As mudanças nos valores e nas concepções sobre o que é a boa vida também tiveram influência na redução do número de casamentos e filhos. Por exemplo, o aparecimento inicial das taxas negativas de crescimento demográfico na Escandinávia e sua subsequente propagação por toda a Europa Ocidental, esteve fortemente associada com a difusão dos valores seculares, o declínio da autoridade religiosa e um maior individualismo. O demógrafo Ron Lesthaeghe e seus colegas coletaram dados abundantes sobre a revolução dos valores entre os jovens, que se propagou por toda a Europa a partir do fim dos anos 1960s. Eles examinaram a mudança de atitudes com relação ao divórcio, ao uso dos contraceptivos, ao sexo, à maternidade/paternidade de solteiros, e à religião organizada e observaram um claro padrão geográfico. As atitudes que eram antigamente chamadas de "transculturais" e hoje associadas com o liberalismo secularizado dominante na Europa, ganharam proeminência inicialmente na Escandinávia no fim dos anos 1960s. Eles então se propagaram para o sul, eventualmente se difundindo pela Espanha, Portugal, Itália e Grécia por volta do fim dos anos 1970s e durante todos os anos 1980s. À medida que essas atitudes se propagaram, as taxas de natalidade e o número de casamentos caíram quase que imediatamente. [18].
Hoje, permanece dentro de países individuais da Europa e do Ocidente em geral, uma forte e crescente correlação entre os valores religiosos conservadores e famílias de tamanho maior do que a média. Na França, por exemplo, as mulheres brancas religiosas e praticantes têm uma vantagem de fecundidade de meio filho a mais em relação às mulheres brancas não religiosas e, como o cientista político Eric Kaufman indicou, essa disparidade está crescendo com o tempo. [19]. Na Espanha, as mulheres que são católicas praticantes têm significativamente mais filhos do que as mulheres católicas não-praticantes — mantendo-se constantes as outras variáveis, como renda, estado civil, nível educacional e outros fatores. [20]. A mesma história pode ser encontrada em todo o mundo, onde os que seguem rigorosamente a religião têm tipicamente um número maior de filhos do que o restante da população. Nossa análise de 53 países de todas as partes do mundo, desde a África até a Oceania, e das Américas até a Europa e o Oriente Médio, indica que os homens e mulheres que participam pelo menos uma vez por mês de serviços religiosos têm, em média, aproximadamente 0.5 filhos a mais do que seus pares que participam menos de uma vez por mês. [21].
Outro fator poderoso parece ser a influência em expansão da televisão e de outras mídias culturais. Até mesmo nos cantos mais remotos do planeta, quando os sinais da televisão chegam, as taxas de natalidade caem de forma bem rápida. Isto é particularmente fácil de observar no Brasil, onde a televisão não foi levada de uma só vez a todo o país, mas estado por estado, de modo que é possível observar que em todos os lugares em que a televisão chegou, as taxas de natalidade caíram. Hoje, o número de horas que a mulher brasileira gasta assistindo às telenovelas de produção nacional prediz fortemente quantos filhos ela terá. [22]. Essas novelas, embora raramente tratem as questões reprodutivas de forma direta, tipicamente mostram indivíduos ricos vivendo na alta sociedade das grandes cidades. Os homens são galanteadores, ambiciosos, sedentos de poder e desvinculados de compromissos. As mulheres são flexíveis, manipuladoras, independentes e no controle de seus próprios corpos. Os poucos personagens que têm filhos pequenos delegam a criação deles para as babás.
Em outras palavras, as telenovelas reforçam uma mensagem cultural que é transmitida também por muitos filmes e outros produtos culturais norte-americanos e europeus de exportação: as pessoas que são ricas, sofisticadas, livres e realizadas são aqueles que têm no máximo um ou dois filhos e que não permitem que as tarefas de criação de filhos ocupem muito espaço em suas vidas emocionantes.
Entretanto, antes de concluirmos que a modernidade necessariamente patrocina a esterilidade, devemos observar uma ainda pequena, porém possivelmente importante contratendência. Em anos recentes, as taxas de natalidade começaram a crescer de forma modesta em países que se comprometeram fortemente com a igualdade de gênero e que têm grande porcentagem de mulheres na força formal de trabalho, como a Suécia e a França.
Em contraste, a fertilidade é hoje a mais baixa nas nações em que a família tradicional e os valores religiosos ainda são comparativamente fortes, mas estão se enfraquecendo, como na Coreia do Sul, Japão, Itália e Grécia. Esse padrão pode refletir parcialmente as diferenças em como o conflito sobre os papéis em evolução dos gêneros está sendo resolvido. Por exemplo, de acordo com observadores culturais na Coreia do Sul, os valores do confucionismo permanecem fortes o suficiente para inibir os nascimentos fora do vínculo do matrimônio, que foram apenas 7.774 no ano de 2007. [23]. Todavia, as taxas de natalidade são muito baixas e o divórcio é relativamente alto. [24]. A explicação comum é que quando as mulheres se casam, elas ainda sentem a pressão social para mostrarem total submissão aos seus maridos e sogras. Para a nova geração de mulheres sul-coreanas, que agora têm muitas oportunidades para conseguirem se manter sozinhas, o casamento parece ser um mau negócio. Assim, muitas permanecem solteiras, se divorciam ou limitam o número de filhos.
Olhando para a fertilidade modestamente mais alta encontrada em pelo menos alguns países que têm grandes números de mulheres que trabalham fora, alguns observadores proclamaram que "o feminismo é o novo natalismo" e propuseram mais medidas para aumentar a igualdade de gêneros e o suporte do Estado às mulheres trabalhadoras como um modo de manter a população. [25]. A premissa desse argumento, porém, é facilmente exagerada. Por exemplo, se o padrão se aplica realmente ao mundo como um todo ou não, é algo questionado pelos demógrafos. [26]. Além disso, as taxas de natalidade anuais relativamente mais altas em países "feministas" como a Suécia ou a França, refletem parcialmente o efeito temporário de mais mulheres terem seu primeiro filho em idades mais avançadas, bem como um crescimento no número de nascimentos fora do vínculo de um matrimônio e a fecundidade comparativamente mais alta das populações de imigrantes. [27].
As Consequências Econômicas da Nova Demografia Global
Qual é o relacionamento entre o crescimento populacional e o crescimento econômico? Menos gente significa que há mais para cada um usufruir? Ou significa que cada um terá de trabalhar mais arduamente?
Com o benefício da experiência e com o conhecimento do passado histórico, não é difícil ver o papel que o crescimento populacional exerceu ao longo do tempo em alimentar o crescimento econômico e o aparecimento de sociedades prósperas. Números maiores frequentemente significavam maiores economias de escala, com as linhas de montagem e outros meios de produção em massa e também permitiram uma maior especialização da mão de obra. [28]. Uma população maior também significa uma maior força de trabalho para as empresas e, crucialmente, uma maior demanda pelos produtos que elas fabricam. O crescimento populacional também pode servir como indutor para a inovação, pois faz as pessoas procurarem meios mais eficientes de produzir alimentos, por exemplo, ou encontrar substituições para os recursos naturais escassos, como o óleo de baleia e a lenha. Quanto mais cérebros estiverem disponíveis para trabalharem nos desafios dos recursos naturais, mais rapidamente alguém surgirá com a ideia que fornece uma solução. O ponto mais geral é que as pessoas podem ser recursos para a economia, e não drenos para ela, desde que exista o ambiente cultural e políticas corretas estejam em vigor. [29]
Portanto, o que acontecerá agora que a grande expansão populacional dos dois últimos séculos está diminuindo? Um efeito de primeira ordem é uma redução no tamanho da força de trabalho global. A população mundial na faixa etária produtiva (15-64 anos) cresceu em 1,3 bilhão, ou 40%, entre 1990 e 2010. Mas, esse ritmo não pode continuar, porque as pessoas que seriam necessárias para fazer isso acontecer nunca nasceram. Devido ao declínio global na taxa de fecundidade ao longo das duas últimas décadas, a população global em idade produtiva provavelmente crescerá em somente 900 milhões entre os anos de 2010 e 2030, ou 400 milhões a menos do que nas duas décadas anteriores. [31]. De fato, ao longo dos próximos 40 anos, a população economicamente ativa se reduzirá em toda a Europa e Ásia Oriental (veja a Figura 5). [32].
Por exemplo, a população em idade produtiva da Europa Ocidental encolherá em tamanho absoluto mesmo com a continuação dos altos níveis de imigração. Ao longo dos próximos vinte anos, o número de homens e mulheres na faixa etária de 15-64 anos cairá por volta de 4% mesmo se a Europa Ocidental aceitar 20 milhões de novos imigrantes. Enquanto isso, a população com mais de 65 anos provavelmente crescerá em torno de 40%. [33]. Tentar persuadir mais mulheres a deixarem o lar e ingressarem na força de trabalho remunerado, como é a política oficial da União Europeia, ajuda a melhorar a baixa relação trabalhadores ativos versus aposentados, mas ao risco de fazer as taxas de natalidade caírem ainda mais. Aumentar a idade média para a aposentadoria também ajudaria a deter o declínio no tamanho da força de trabalho, mas aqui existem claros limites políticos e práticos. Por exemplo, a despeito da conversa que "os setentões hoje são os novos sessentões", a saúde da próxima geração de cidadãos de terceira idade no mundo desenvolvido provavelmente será menor do que é hoje. A razão é o forte aumento nas condições crônicas entre aqueles que hoje estão no fim da meia-idade, devido à epidemia global da obesidade e de outros fatores. [34].
Na Europa e na Ásia Oriental, o declínio no número de trabalhadores mais jovens será até mais agudo que o declínio no número de trabalhadores mais velhos, com consequências que poderão ser particularmente graves para o dinamismo econômico. Em todos os países do mundo, independente de seu estágio de desenvolvimento econômico, forma de governo, ou estrutura etária, os índices mais elevados de empreendedorismo são encontrados entre aqueles que estão na faixa dos 25-34 anos — um grupo etário cujo número estará em queda em muitos países avançados. (veja Figura 6). [35].
Durante os estágios iniciais do declínio da fecundidade, as nações frequentemente experimentam uma prosperidade, um fenômeno conhecido como "dividendo populacional". À medida que as taxas de natalidade caem inicialmente, uma proporção crescente de trabalhadores ocupa os melhores anos produtivos do início da idade adulta. Com um número menor de crianças por perto para cuidar e sustentar, vastas reservas da mão de obra feminina ficam liberadas para ingressarem na economia de mercado e os adultos estão livres para reservarem mais dinheiro para a poupança, para a compra de bens duráveis e de imóveis. As sociedades que passam por esse estágio inicial de envelhecimento da população frequentemente descobrem que têm mais recursos disponíveis para investir em cada criança restante, de modo que suas taxas de alfabetização, por exemplo, melhoram. Este fenômeno aconteceu claramente no Japão e em outros "tigres asiáticos" desde os anos 1960s até os 1990s e ainda ocorre hoje na China. [36].
Todavia, com a virada para a próxima geração, o "dividendo demográfico" precisa ser restituído. Desde que as taxas de fecundidade permaneçam baixas, existem ainda comparativamente menos crianças, mas a proporção de trabalhadores jovens produtivos agora começa a declinar, ao mesmo tempo que as fileiras de cidadãos de meia idade, avessos a riscos, e de idosos dependentes explodem. O envelhecimento da população deixa de ser uma força positiva para o desenvolvimento econômico e para a inovação e passa a drenar os recursos — como está agora acontecendo no Japão, que precisa pagar pelos custos crescentes da previdência social pública à medida que sua população em idade produtiva diminui e sua população de idosos aumenta. [37]. Isto também acontecerá na China ao longo dos próximos quarenta anos, como indica a Figura 5. A população chinesa em idade produtiva começará a cair em torno de 1% a cada ano após 2016 — com sua população de pessoas na faixa de 20-39 anos especificamente com um declínio mais acentuado. [38]. Enquanto isso, a população de idosos chineses (pessoas com 65 anos ou mais) crescerá de 109 milhões, ou 8,2% da população, para 279 milhões, ou 20% da população, por volta de 2035. [39]. Os demógrafos chineses agora falam sobre o aparecimento de uma sociedade 4-2-1, em que um único filho torna-se responsável pelos dois pais e quatro avós. Este cenário fará a China experimentar uma crise até mais séria do que aquela que o Japão está experimentando agora, por causa do envelhecimento de sua população.
Finalmente, a queda global no número de casamentos provavelmente também irá deprimir e distorcer o crescimento econômico. As evidências obtidas na Europa e na América do Norte indicam que as crianças que são criadas em lares intactos e com seus pais casados têm maior probabilidade de se destacarem na escola e serem ativas na força de trabalho como jovens adultos, em comparação com as crianças que crescem em lares não-intactos. [40]. Os homens adultos casados também trabalham com maior dedicação do que os solteiros e alcançam uma melhoria de renda que varia de 10 a 24% em relação a estes, em países como Alemanha, Israel, México e EUA. [41]. Estas descobertas sugerem que as economias de mercado nas Américas e na Europa — desde o Canadá até ao Chile, da Espanha até a Suécia — que estão agora experimentando uma queda no número de casamentos também colherão uma nova safra de problemas, à medida que um número menor de crianças tiver a oportunidade de adquirir o capital humano e social necessário para prosperar na economia global e à medida que um número menor de homens tiver a motivação que o casamento traz para um envolvimento total no mundo do trabalho.
O Estado do Bem-Estar Social em uma Sociedade Envelhecida
O financiamento do Estado do bem-estar social depende criticamente do crescimento populacional e de famílias fortes, conforme evidenciado pelo doloroso retorno dos problemas sociais na envelhecida Europa e sua crise da dívida soberana, bem como no agravamento dos problemas da dívida no Japão. De fato, um relatório recente do banco de investimentos Morgan Stanley sugere que a proporção de idosos em um país pode agora ser um indicador mais importante de sua possibilidade de decretar um calote do que o tamanho de sua dívida atual, especialmente por que os eleitores idosos provavelmente não apoiarão reformas no sistema de previdência pública que limitem sua renda. [42].
As fontes demográficas da crise atual no Estado do bem-estar social não são difíceis de compreender. Enquanto a população estiver crescendo, cada nova geração de aposentados pode receber bem mais em pensões públicas e benefícios de assistência à saúde do que eles pagaram sem criar sobrecarga financeira sobre o futuro da nação. Mas, diante do envelhecimento atual da população, os benefícios para os idosos não podem mais ser financiados por uma força de trabalho em rápida expansão. Esses benefícios precisam ser limitados para aquilo que uma população em idade produtiva cada vez menor é capaz e está disposta a contribuir para o suporte aos idosos.
França, Alemanha, Suécia, Itália, Japão e muitos outros países com população envelhecida já fiveram cortes draconianos em suas pensões futuras prometidas e a insolvência, ou ameaça de insolvência, está forçando muitos outros países (como a Grécia, Espanha e Irlanda) a seguirem o mesmo caminho. [43]. Até mesmo os EUA estão agora diante de um problema similar; por exemplo, em 2010 a Previdência Social começou a pagar mais para os idosos do que está recebendo em contribuições dos trabalhadores ativos atuais. [44]. Em uma sociedade envelhecida, gastos crescentes com aposentadorias e assistência à saúde para os idosos também competem inevitavelmente com os recursos disponíveis para investir nas crianças e nas famílias. Diante do aumento do déficit orçamentário, a Grã-Bretanha cortou os benefícios para as crianças, ao mesmo tempo que em grande parte protegeu os aposentados. [45]. Assim, os declínios na fecundidade e o crescimento do número de idosos na população representam um desafio fundamental para a viabilidade financeira do Estado do bem-estar social em grande parte do mundo desenvolvido.
Políticas de Família Apropriadas em uma Sociedade Que Envelhece
Quais são, então, as respostas em termos de políticas apropriadas para o estado insustentável da vida familiar em muitas sociedades avançadas? Aqui estão dez propostas que poderão ser úteis:
1. Promover a Empresa Familiar
A última geração viu um rápido aumento na consolidação das grandes empresas. A imposição rigorosa de políticas para impedir a formação de cartéis, bem como outras políticas, preservaram um papel importante para as fazendas e empresas familiares de pequena escala até os anos 1980s, porém hoje praticamente não existe limitação ao crescimento das grandes lojas de varejo, do agronegócio e das indústrias. Como o teórico social britânico Phillip Blond escreveu: "Nossos peixeiros, açougueiros e padeiros foram expulsos do mercado — toda uma classe de proprietários de pequenos negócios foi transformada em assalariados de baixa renda, que trabalham em supermercados." [46]. Embora não seja possível, nem mesmo desejável, reverter totalmente essas tendências de criação de monopólios, é possível moderá-las e, desse modo, criar mais espaços para a empresa familiar e para o empreendedorismo, o que, por sua vez, ajudará a reconstruir a base econômica das famílias. Um bom início seria oferecer isenções tributárias na folha de pagamento das pequenas empresas e agir mais rigorosamente para impor a legislação existente de modo a impedir a formação de cartéis.
2. Aumentar a Segurança na Renda para os Jovens Casais
Os jovens casais que contemplam iniciar uma família enfrentam hoje em dia riscos muito maiores do que seus pais tipicamente enfrentaram: o desemprego e o sub-emprego. Como o cientista político Jacob Hacker demonstrou, mesmo antes da Grande Recessão de 2008, as retenções de imposto de renda na fonte dobraram nos EUA desde o início dos anos 1970s. [47]. Na Europa, muitos adultos jovens tipicamente encontram-se manobrando de um contrato de trabalho para outro, em vez de poderem se fixar em uma carreira segura que lhes permita manter uma família. No mundo desenvolvido, os jovens adultos frequentemente se encontram tentando sobreviver no meio da agitação das megacidades supercompetitivas e que literalmente parecem não ter espaço para as crianças.
Não há uma única alavanca de política a puxar que colocará a família de volta em um equilíbrio saudável e sustentável com as forças globais do mercado. Precisamos enfrentar questões como comércio exterior, emprego fora do país e redução de custos e das estruturas empresariais (downsizing). Todavia, é essencial que as medidas de eficiência não sejam definidas de forma tão estreita que desconsiderem o papel vital que as famílias protegidas e funcionais exercem em sustentar o progresso econômico. Para suavizar os golpes que os adultos jovens enfrentam com a instabilidade no emprego e na renda que está associada com o processo da globalização, os países deveriam garantir a assistência à saúde de forma acessível e oferecer cursos de atualização para evitar que as habilidades profissionais se tornem obsoletas.
3. Facilitar a Tensão Entre a Educação Superior e a Formação de uma Família
A educação de uma mulher prediz fortemente quantos filhos ela terá. Para as mulheres americanas entre 40-44 anos em 2008, o número médio de filhos entre aquelas com diplomas de nível superior era apenas 1,6, em comparação com 2,4 daquelas que nunca concluíram o ensino de nível médio. Um total de 21,5% das mulheres de alta formação educacional permanece sem filhos durante toda a vida, em comparação com somente 15% daquelas que desistem do curso universitário. [48].
De certa forma, essas disparidades simplesmente refletem as diferentes prioridades e preferências individuais. Entretanto, também refletem os severos obstáculos no caminho dos casais que querem iniciar famílias enquanto ainda são biologicamente capazes de fazer isso e, ao mesmo tempo, querem seguir um curso universitário. Em nosso atual sistema de educação de nível superior, uma mulher que queira, digamos, interromper sua educação aos 20 anos para iniciar uma família e então retornar à escola aos 30 anos, enfrentará grandes dificuldades para conseguir a admissão. As instituições de ensino superior, bem como os empregadores, deveriam incluir os indivíduos que já são pais em seus compromissos de promover a diversidade e superar os padrões históricos de discriminação. [49].
4. Construir Comunidades Habitáveis e Favoráveis às Famílias
Em todo o mundo, o alto custo da moradia está intimamente associado com a baixa taxa de fecundidade. Isto é particularmente verdadeiro no Japão, na Coreia do Sul, na Europa e na região costeira da China. [40]. Embora a moradia seja comparativamente mais barata em grande parte dos EUA, a deterioração do sistema público de ensino força os pais a disputarem casas nas proximidades das boas escolas que ainda restam, ou então a pagar escolas particulares ou limitar o tamanho de suas famílias. Ao mesmo tempo, o baixo investimento em transportes — particularmente no transporte público eficiente e de baixo custo — força os pais em muitas cidades a fazerem longas viagens para levar as crianças à escola, o que também tem um impacto emocional e financeiro sobre a vida familiar. [51]. Os bairros residenciais das cidades, que antes eram uma fonte de fertilidade, precisam ser readequados e modernizados para que se tornem novamente favoráveis às famílias.
As respostas políticas necessárias para tratar essas ameaças à família são muito mais fáceis de serem declaradas do que alcançadas. Todavia, reformas vitais, como melhorar a educação pública, reduzir a dependência do automóvel particular e promover comunidades que não dependam tanto do automóvel talvez sejam mais fáceis se esses objetivos forem vinculados às necessidades das famílias. Salt Lake City, que tem a mais alta taxa de fecundidade entre todas as regiões metropolitanas nos EUA, tem feito, desde o fim dos anos 1990s, um imenso e bem-sucedido compromisso de conter a expansão dos bairros e de construir linhas de trens urbanos, sob a influência da Igreja Mórmon. [52].
5. Respeitar os Ideais de Família e Trabalho de Todas as Mulheres
As mulheres são diferentes em suas preferências de vida e, da mesma forma, no que se refere ao equilíbrio entre maternidade e carreira profissional. Por exemplo, nos EUA, cerca de 20% das mulheres casadas que são mães declaram que sua preferência ideal é permanecer em um emprego de tempo integral, quase metade prefere trabalhar em meio período e um terço prefere deixar de trabalhar fora do lar enquanto cria os filhos. [53]. Embora as proporções de mulheres que expressam preferência por uma dessas três opções varie com o tempo e de país para país, a pesquisa mostra que as relações são bastante consistentes. Em geral, nos países desenvolvidos, cerca de 20% das mulheres favorecem uma vida centrada no lar, 60% preferem uma vida que combine carreira e família e cerca de 20% estão preocupadas principalmente com a carreira somente. [54].
Infelizmente, as políticas do governo para as famílias muitas vezes ignoram essa diversidade que existe entre as mulheres. Em vez disso, existe geralmente um viés em relação às necessidades das mães que trabalham fora do lar e uma negligência com aquelas que estão centradas no lar. As políticas pró-natalistas provavelmente não serão eficazes se visarem principalmente as mulheres que estão orientadas para a carreira profissional; essas mulheres não somente são uma minoria em qualquer população nacional, mas são geralmente as mais resistentes ao aumento no número de filhos. Como a socióloga Catherine Hakim indicou, as políticas de família que estão direcionadas somente para os problemas particulares das famílias com dois contracheques deixam de "reconhecer e aceitar a heterogeneidade das preferências no estilo de vida das mulheres (e dos homens)." [55].
Aqueles que definem políticas deveriam adotar programas como o bem-sucedido auxílio para cuidar do lar, que existe na Finlândia, que fornece aos pais que não usam as creches públicas um estipêndio que eles podem usar para engordar seu próprio orçamento familiar — ou pagar para que uma avó, vizinha, amiga, ou babá, cuide de suas crianças. Na Finlândia, esse estipêndio é de um valor menor do que o custo da creche pública e está vinculado com os aumentos na fecundidade. [56]. O mais importante é ele permite que as mulheres escolham a melhor opção para si mesmas e para suas famílias.
6. Apoiar o Casamento e a Paternidade Responsável
Existem limites naquilo que um governo pode ou deve fazer para promover o casamento como uma instituição. Entretanto, as políticas públicas deveriam parar de penalizar o casamento e deveriam também apoiar as iniciativas para educar o público a respeito dos benefícios do casamento e os riscos da paternidade/maternidade para os solteiros. Isto não é diferente dos esforços do governo para educar o público a respeito dos benefícios das cadeirinhas para crianças nos automóveis, ou dos riscos do cigarro.
Primeiro, muitas políticas públicas não intencionalmente penalizam o casamento ao reduzirem ou eliminarem os benefícios públicos para os pais que se casam e, dessa forma, passam a ter duas rendas, em vez de uma. [57]. As políticas públicas direcionadas para as famílias devem ser oferecidas de forma universal, ou devem permitir que os pais dividam sua renda ao determinar se a família tem o direito de obter suporte público.
Segundo, os governos devem testar a eficácia das campanhas de publicidade social a favor do casamento — especialmente aquelas que conectam o casamento com a paternidade. A experiência mostra que campanhas de publicidade social bem-planejadas direcionadas a mudar o comportamento sexual, o uso de drogas e os hábitos de fumar podem ter um impacto positivo. [58]. Em alguns casos, o impacto dessas campanhas provou ser modesto. Todavia, o custo extraordinário, tanto para os indivíduos quanto para a sociedade, de ter de enfrentar, por exemplo, os nascimentos fora do casamento, torna a publicidade social dirigida a mudar esses comportamento provavelmente eficiente em termos de custo. Essas campanhas também podem provocar um debate salutar na sociedade a respeito da importância do casamento para a criação de filhos.
7. Promover a Parcimônia
Hoje, os adultos jovens nos países desenvolvidos e, cada vez mais também nos países em desenvolvimento, estão sobrecarregados por dívidas em um nível sem precedentes. De acordo com o Projeto Sobre Dívida Estudantil, o estudante americano recém-formado na universidade nas turmas de 2009 possui uma dívida de US$ 24.000 nos programas de financiamento estudantil, um valor que cresceu 6% a cada ano desde 2003. [53]. Montanhas de dívidas em cartões de crédito também agora tipicamente sobrecarregam os jovens casais que estão contemplando a possibilidade de iniciar uma família; isto, obviamente, desencoraja a fecundidade.
Melhores leis de proteção às finanças do consumidor (e o cumprimento delas) são parte da solução, desde coibir os empréstimos a juros extorsivos até impor contratos padronizados e fáceis de compreender para cartões de crédito e hipotecas. Da mesma forma, a restauração da ética da parcimônia, que historicamente foi um pilar da florescente classe trabalhadora e das famílias de classe média. Até os anos 1960 era comum nos EUA a celebração da "Semana da Poupança", atrelada ao aniversário de Benjamin Franklin, em 17 de janeiro. Naquele tempo, as escolas públicas tinham seu próprio banco para os alunos, permitindo que milhões de crianças aprendessem melhor os fundamentos da administração financeira e os hábitos da parcimônia. A poupança e os empréstimos incentivavam a parcimônia por meio dos planos de poupança para o Natal. E assim por diante. Precisamos renovar essa ética para os nossos dias. Restaurar o hábito de poupar é um projeto que pode durar uma geração, mas também é um pré-requisito se quisermos restaurar a saúde e fertilidade da família moderna. [60].
8. Ajustar o Financiamento do Estado do Bem-Estar Social Para Atender às Necessidades de uma Sociedade Que Está Envelhecendo
Todos os benefícios previdenciários e de assistência à saúde, incluindo aqueles feitos pelo setor privado, são no fim financiados pelos bebês e por aqueles que os criam e educam. Todavia, nas sociedades modernas, o "setor protetor/alimentador" da economia fica sem recursos. Os pais, em particular, raramente recebem qualquer compensação material pelos sacrifícios que fazem por suas crianças.
Aqui está uma ideia de política sugestiva para permitir que o setor protetor/alimentador mantenha uma maior participação do valor que cria para a sociedade. O governo deve dizer para a próxima geração de adultos jovens: "— Tenha um filho, e a contribuição previdenciária descontada no seu salário, que suporta os idosos, será cortada em um terço. Com um segundo filho, a redução será de dois terços. Tenham três ou mais filhos e você não terá a contribuição previdenciária deduzida de seu salário até que seu filho mais novo atinja 18 anos. Quando chegar o tempo de você se aposentar, seu benefício (e o do seu cônjuge) será calculado exatamente como se você tivesse contribuído com o máximo durante o período em que criou seus filhos, desde que todos eles tenham concluído o ensino médio."
9. Remover o Lixo Cultural
Como vimos, a televisão e outras mídias globais parecem exercer um papel importante na queda do número de casamentos e nascimentos. Desde os esforços das estrelas da música popular em promover a liberação sexual, aos filmes da indústria do cinema em Hollywood, jogos de computador violentos e a onipresente pornografia na Internet, a mídia global envia um forte mensagem para os jovens de todo o mundo que um estilo de vida centrado na família é algo que está fora de moda.
Em certa medida, podemos esperar que esses excessos e distorções culturais se autocorrijam. Exatamente como aconteceu durante a Era Vitoriana, quando o temor de uma população pequena demais, particularmente entre as elites, levou a uma reforma nos costumes e na moral, haverá cada vez menos tolerância com aqueles que não contribuem com filhos para a sociedade ou cujas atividades produzem corrupção moral nas crianças. Mas, os produtores da indústria do cinema, os anunciantes e outros empresários culturais precisam se atualizar a respeito da nova realidade demográfica e se conscientizar que vivemos agora em um mundo em que famílias sólidas não podem mais ser consideradas algo que surge espontaneamente — muito menos podem ser alvos de zombaria constante e trivializadas.
10. Respeitar o Papel da Religião como uma Força Pró-Natalidade
Não ter filhos ou ter famílias pequenas é cada vez mais comum entre as pessoas secularizadas. Enquanto isso, na Europa, nas Américas, em Israel, no restante do Oriente Médio, e em outras partes do mundo, há uma forte correlação entre a adesão aos valores religiosos do cristianismo ortodoxo, da fé islâmica ou do judaísmo e famílias estáveis e maiores.
Em reconhecimento à contribuição que a religião faz para a vida das famílias e para a fecundidade, os governos não deveriam perseguir as pessoas de fé por aderirem ou expressarem visões que estão fundamentadas na tradição religiosa, incluindo aquelas que ferem as sensibilidades progressistas ou nacionalistas. Infelizmente, esse tipo de perseguição é agora comum em alguns países do mundo, do Canadá até a China, França, etc. [61]. A fé traz esperança e é a esperança que renova a espécie humana.
Nenhuma destas dez propostas chega perto do que seria adequado para solucionar os desafios criados pela nova demografia do século 21. Todavia, elas são sugestivas da abordagem filosófica que é necessária — uma abordagem que enfatize o papel crítico da família intacta, que educa e nutre as crianças, e que seja financeiramente segura para sustentar e renovar o capital humano, social e financeiro das sociedades envelhecidas em todo o mundo.
Nota: texto corrigido as 21:46 do mesmo dia
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