Euronews, 29 de maio de 2017.
Por Hans von Brelie.
Michal Kurzawa tem 18 anos, é polaco, vive não muito longe de Varsóvia e faz parte de um grupo paramilitar denominado “Os Atiradores”. Está longe de ser um caso isolado: tal como muitos outros jovens, Michal diz sentir que a Polónia não está segura depois de a Rússia ter anexado a Crimeia e do leste da Ucrânia ter mergulhado num conflito devastador.
O número de polacos que se voluntariou para aderir a treinos paramilitares não para de aumentar. Os exercícios são feitos com réplicas de armas. Michal possui uma arma verdadeira, escondida na cave da sua casa.
“Acho que o acesso às armas devia ser mais facilitado na Polónia, porque acredito que o nosso país enfrenta uma ameaça nas fronteiras a leste, assim como da parte de países do terceiro mundo. Acho que toda a gente devia poder aceder mais facilmente aos treinos de tiro. Devia haver carreiras de tiro em cada cidade para preparar a população”, diz-nos.
“A grande ameaça à Polónia é a Rússia e Putin”
Os exercícios decorrem numa floresta que serve normalmente de parque de campismo. Na verdade, o governo polaco decidiu criar uma Força de Defesa Territorial em forma de milícias para ajudar a proteger o país de uma eventual invasão. A ideia é formar até 2023 uma reserva de 53 mil unidades que possa complementar os cerca de 100 mil militares que existem hoje em dia nas forças armadas polacas.
A questão lançou o debate entre os polacos: que tipo de armamento devem receber cidadãos comuns com treino paramilitar? Que implicações têm as milícias para a estruturação da segurança no país e no âmbito da NATO? Vamos dar uma volta de drone para ter uma visão mais alargada da situação.
A verdade é que o governo pretende que estes voluntários paramilitares venham a integrar a futura força territorial. No total, prevê-se um investimento de cerca de 800 milhões de euros. Em quê? Segundo uma fonte militar, em equipamento diverso, como espingardas, mas também mísseis antiaéreos e drones.
Pedimos a Michal para especificar a ameaça que motiva tudo isto. “A grande ameaça à Polónia é a Rússia e Putin”, responde-nos.
A Força de Defesa Territorial deverá estar preparada para um ataque híbrido, isto é, uma ofensiva composta pela vertente militar, mas também por outros cidadãos que se posicionem do outro lado da barricada. No entanto, no caso da Polónia, a existência de minorias russas não é expressiva. Se houver uma intervenção, esta será provavelmente convencional. E aí, face ao poderio militar russo, a eficácia dos paramilitares torna-se muito relativa.
“Não somos o único país a conceber esta ideia”
Há 17 mil polacos que já se candidataram para fazerem parte da Força de Defesa Territorial. Mas Michal, por exemplo, não é um deles, uma vez que não considera lógico submeter-se a uma cadeia de comando militar composta por verdadeiros soldados. No entanto, essa não é a única razão.
“O ministro da Defesa polaco, Antoni Macierewicz, quer criar o seu próprio exército privado. Basta ver o exemplo da guarda nacional americana, que pode ser usada para reprimir os outros cidadãos. Não gosto desse conceito…”, afirma.
Zbigniew Antolak-Gaczynski, o comandante do grupo de Michal, é um antigo soldado que recusou a proposta do Ministério da Defesa para estruturar a Força de Defesa Territorial nesta região.
“Não sei o que o nosso ministro da Defesa tem em mente, não estou dentro da cabeça dele… Mas se olharmos atentamente para o texto da nova lei, se lermos as novas disposições, torna-se evidente que a Força de Defesa Territorial pode ser usada de outras formas que não aquela anunciada oficialmente”, considera.
A base da força territorial será um antigo forte. O porta-voz das Forças Armadas, Marek Pietrzak, diz-nos que os civis estão muito motivados para defender o seu país e conhecem as infraestruturas e os recursos locais como ninguém.
“Não existe qualquer risco que a Força de Defesa Territorial venha a ser utilizada contra os cidadãos polacos. Esta força surge como resposta a um contexto geopolítico que está em mutação, sobretudo na Europa de Leste e Central. Nós não somos o único país a conceber esta ideia. Os primeiros a adotá-la foram a Suíça e os países escandinavos. Mas há muitos outros que também o fizeram, como os Estados Bálticos, a Roménia, a Bulgária…”, declara.
Fomos ao encontro de uma voz particularmente representativa da oposição: o antigo ministro da Defesa, Tomasz Siemoniak, que olha para esta ideia como um “enorme desperdício de dinheiro”, desfasado da realidade do século 21 e da necessidade de proteger o país contra o ciberterrorismo, por exemplo.
“Eles vão ser uma espécie de soldados de fim de semana… Este tipo de treino militar devia ser implementado para soldados na reserva, que façam parte do exército regular e que possuam uma preparação militar integral. Os reservistas sim podem ser uma grande ajuda ao exército, não os soldados de fim de semana que eles querem produzir. Isso é pura ficção”, aponta.
Outra voz crítica é a de Slawomir Sierakowski, um analista político que denuncia o caráter eleitoralista deste projeto: “Organizar 50 mil pessoas é organizar um eleitorado. Para o Ministério da Defesa, isto significa mais 50 mil eleitores, sem contar com as famílias…”.
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