23 de mai. de 2016

Merkel avisa Erdogan: não haverá vistos sem reformas




DN, 23 de maio de 2016.



Por Susana Salvador.



Chanceler alemã afastou hipótese de liberalizar entradas dos cidadãos turcos a 1 de julho, como exigem autoridades de Ancara

A chanceler alemã, Angela Merkel, deixou claro que não haverá isenção de vistos para os cidadãos turcos na União Europeia enquanto não houver uma reforma da lei antiterrorista. "Devemos fazer tudo para continuar a discutir porque previsivelmente, até 1 de julho, algumas coisas não estarão prontas, como a isenção de vistos, porque as condições não foram cumpridas", disse Merkel aos jornalistas depois de um encontro com o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan. O problema é que a Turquia ameaça romper os acordos em vigor, nomeadamente o pacto que permitiu reduzir o número de refugiados que chegam à Grécia.



A União Europeia estabeleceu 72 condições à Turquia para liberalizar as entradas na zona Schengen, exigência feita por Ancara para continuar a aplicar o controverso pacto que permitiu travar as entradas de imigrantes ilegais na Grécia. Uma dessas 72 condições é o suavizar da lei antiterrorista, que inclui uma definição muito lata do que é a "propaganda terrorista" (que já permitiu acusar vários jornalistas e jovens universitários). Erdogan recusa fazer alterações à lei, com Merkel a repetir que sem isso não haverá vistos.

Os avisos da chanceler não se ficaram por aí. Merkel não poupou nas palavras e disse a Erdogan, no encontro à margem da Cimeira Humanitária Mundial, que uma democracia precisa de "um sistema judicial independente, de media independentes e de um parlamento forte". As críticas surgem depois de o parlamento turco (onde o AKP de Erdogan tem a maioria) ter levantado a imunidade a dezenas de deputados do partido pró-curdo HDP, acusados de apoiar os terroristas do PKK.

"Obviamente que o levantamento da imunidade de um quarto dos deputados é uma fonte de profunda preocupação, o que disse ao presidente turco", indicou Merkel aos jornalistas. A chanceler explicou que falou abertamente sobre o tema com Erdogan e que houve algumas perguntas que ficaram sem resposta, pelo que continuará atenta à situação.


Os opositores do presidente turco dizem que a decisão de levantar a imunidade dos deputados tem como objetivo afastar o terceiro maior partido, que Erdogan acusa de ser a ala política do PKK (que lidera uma insurreição contra Ancara há mais de três décadas). "Deixei claro que a luta contra o PKK é correta e necessária, mas por outro lado que tudo deve ser feito para que as pessoas de origem curda tenham oportunidades justas na Turquia", disse Merkel.

Cimeira inédita

"Estamos aqui para criar um futuro diferente", disse ontem o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon na abertura da Cimeira Humanitária Mundial, que reúne 60 chefes de Estado e governo e inúmeras organizações não governamentais em Istambul. O objetivo do encontro é encontrar formas de "reparar" a forma como funciona o "danificado" sistema humanitário. Há, atualmente, cerca de 60 milhões de deslocados e 125 milhões de pessoas a precisar de assistência. "Não é uma tarefa fácil."

O anfitrião da cimeira, Erdogan, exortou a comunidade internacional a "assumir a sua responsabilidade", lembrando que o sistema atual tem "insuficiências". A Turquia acolhe atualmente cerca de três milhões de refugiados, incluindo 2,7 milhões de sírios, e pede à Europa que acolha mais.


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