Francisco condenou ataque "odioso" que fez pelo menos 72 mortos e 300 feridos em Lahore no Domingo de Páscoa.
"As minhas filhas estavam no parque. Morreram as duas. Encontrámos um corpo, o outro está desaparecido", conta uma mãe à BBC, enquanto chora no ombro de outra. As filhas eram duas das 29 crianças que morreram no domingo num ataque suicida contra um parque infantil que fez pelo menos 72 vítimas mortais em Lahore, na zona oriental do Paquistão. Reivindicado pelo Jamaat-ur-Ahrar, um grupo dissidente dos talibãs, o atentado tinha como alvo a minoria cristã que no domingo celebrava a Páscoa. Ontem, o papa Francisco, que já este mês aceitou um convite para visitar o Paquistão, condenou um ataque "odioso", exigindo que o governo de Islamabad proteja as suas minorias.
O próprio Jamaat-ul-Ahrar, responsável por cinco atentados bombistas em solo paquistanês desde dezembro, confirmou através de um porta-voz que desta vez o alvo eram "os cristãos", mesmo se, feitas as contas, a maioria dos mortos era muçulmana. O representante dos talibãs sublinhou ainda: "Quisemos mandar esta mensagem ao primeiro-ministro Nawaz Sharif a dizer que entrámos em Lahore."
Capital da província mais rica do Paquistão, o Punjab, Lahore tem uma forte comunidade cristã. Perto de três milhões em todo o Paquistão (1,6% da população), esta minoria é constituída sobretudo por descendentes de hindus de casta baixa que se converteram nos tempos coloniais. Por isso ainda hoje, passados quase 70 anos da partição da Índia britânica e da criação do Paquistão como pátria para os muçulmanos, constituem um dos setores mais pobres da sociedade, dedicando-se sobretudo à agricultura. Mas também há alguns cristãos mais ricos, sobretudo descendentes dos que vieram de Goa ainda na era colonial e se instalaram sobretudo em torno de Carachi (ver texto secundário).
Desafiado pelos talibãs, o primeiro-ministro, Nawaz Sharif, apelou a uma melhor coordenação entre agências de segurança no combate ao terrorismo. Num encontro com responsáveis pela segurança, o chefe do governo sublinhou o "empenho crescente" do seu país na luta contra terroristas que atingem alvos cada vez mais inocentes. No poder desde junho de 2013 (mas já antes fora primeiro-ministro por duas vezes nos anos 1990), Sharif foi visitar alguns dos mais de 300 feridos - um número que deixa adivinhar que as vítimas mortais possam aumentar.
Entretanto, com as ruas de Lahore quase desertas ontem, escolas, mercados e tribunais encerrados, o exército paquistanês realizou raides na cidade, mas também em Multan e Faisalabad. Durante estas operações, os militares detiveram um número ainda por revelar de pessoas e apreenderam várias armas.
Alvos
Separado dos talibãs paquistaneses desde 2014, o Jamaat-ul-Ahrar tem reivindicado vários ataques terroristas. É, entre outros, responsável pelos ataques a duas igrejas em Lahore em 2015, que fizeram 14 mortos e 70 feridos.
Nos últimos 15 anos, o Paquistão tem vivido mergulhado na violência, desde que se juntou aos EUA na luta contra o terrorismo islamita após os atentados de 11 de setembro e a consequente guerra contra os talibãs no vizinho Afeganistão. O conflito empurrou os talibãs para as zonas montanhosas entre os dois países, onde recuperaram parte da sua força, tendo-se entretanto subdividido em vários grupos. Apesar de o exército, a polícia e o governo serem os seus alvos preferenciais, os talibãs paquistaneses e seus aliados também atacam os cristãos.
Mas os atentados não são a única forma de perseguição contra os cristãos. Desde os anos 1990, muitos têm sido acusados de blasfémia. Um dos casos mais conhecidos é o de Asia Bibi, residente de uma aldeia do Punjab que em 2010 se envolveu numa discussão com outras mulheres e acabou acusada de blasfémia contra Maomé e condenada à morte. A sentença foi suspensa pelo Supremo Tribunal do Paquistão que volta agora a examinar o recurso da acusação. E chegar a cargos de poder não coloca os cristãos ao abrigo dos islamitas: Shahbaz Bhatti, ministro das Minorias e líder cristão, foi assassinado em 2011 pelos talibãs após criticar as leis da blasfémia.
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