IP, 19/01/2024
Apesar de a Coreia do Norte e o Irã avançarem em seus planos nucleares e de Vladimir Putin ter ameaçado usar as armas da Rússia, importantes limites não foram ultrapassados, afirmou um especialista de destaque à AFP.
"A ordem nuclear pode estar sendo atacada, abalada e contestada, mas seus fundamentos ainda são sólidos e seus elementos mais essenciais ainda estão presentes", disse o especialista nuclear francês Bruno Tertrais em uma entrevista.
"Coreia do Norte, China, Índia e Paquistão continuam determinados a se estabelecerem como potências nucleares maduras, e não se importam com apelos para moderar, quanto mais desarmar", disse Tertrais, vice-diretor da Foundation for Strategic Research (FRS), um think tank francês.
O Irã está continuando seu enriquecimento de urânio a níveis muito superiores a 3,67%, em violação de um acordo quase extinto de 2015 com potências ocidentais, e está se aproximando dos 90% necessários para produzir uma bomba atômica.
Enquanto isso, no ano passado, a Coreia do Norte consagrou seu status como potência nuclear em sua constituição e, desde então, disparou vários mísseis balísticos intercontinentais, em violação das resoluções da ONU.
Nesta sexta-feira, Pyongyang disse ter testado um "sistema de arma nuclear subaquática" em resposta a exercícios navais conjuntos de Washington, Seul e Tóquio que envolveram um porta-aviões nuclear dos EUA.
Os últimos meses têm visto uma acentuada deterioração nas tensas relações de longa data entre as duas coreias, com Kim Jong Un declarando o Sul como o "inimigo principal" de seu país.
Tertrais disse que a postura agressiva do Norte faz parte de uma "política de dissuasão".
"Não li nada nas últimas declarações da Coreia do Norte que constitua uma ruptura com o que ela tem dito há cerca de vinte anos", afirmou. "Já no final dos anos 90, a Coreia do Norte ameaçou transformar Seul em um mar de fogo", disse.
"A Coreia do Norte continua a construção paciente e determinada de uma força nuclear plenamente operacional", acrescentou Tertrais.
Mas Pyongyang também queria lembrar o mundo sobre seu programa depois que as potências globais voltaram sua atenção para os conflitos na Ucrânia e em Gaza, observou o especialista.
Do lado russo, o desdobramento da arquitetura de controle de armas nucleares da Guerra Fria começou com a retirada dos EUA do Tratado ABM (Anti-Ballistic Missile), assinado em 1972, em 2001.
No ano passado, a Rússia suspendeu sua participação no Novo START, o último tratado de armas nucleares restante entre Washington e Moscou (2010).
"Em termos de controle bilateral de armas, estamos chegando ao fim de um ciclo", disse Tertrais.
Mas ele argumentou que isso não significa que Rússia e Estados Unidos vão retomar uma corrida armamentista, embora ambas as potências estejam modernizando seus arsenais.
"As 'armas nucleares exóticas' de Vladimir Putin", como mísseis hipersônicos projetados para superar todas as defesas inimigas, "ainda não mostraram que produzirão avanços estratégicos", disse Tertrais.
O Tratado de Não Proliferação Nuclear, que entrou em vigor em 1970, ainda está em vigor, destacou ele, mesmo que a Coreia do Norte tenha anunciado sua retirada unilateral em 2003.
Tertrais também afirmou que a proliferação nuclear permaneceu limitada nos últimos 80 anos.
Apenas nove estados – EUA, Rússia, China, França, Grã-Bretanha, Índia, Paquistão, Israel e Coreia do Norte – possuem armas nucleares.
"Por quase 20 anos, nenhum país, exceto o Irã, mostrou a vontade de se tornar uma potência nuclear", disse ele.
Os tabus em torno de testes e uso de armas atômicas permanecem fortes.
Tertrais observou que não houve testes nucleares confirmados em qualquer lugar do mundo nos últimos cinco anos, acrescentando que a doutrina de dissuasão nuclear ainda se mantém.
"O que está acontecendo na Ucrânia confirma o que sabemos há muito tempo", disse ele.
"Quando a sombra de armas nucleares é lançada sobre um conflito e várias partes militarmente e politicamente envolvidas possuem essa arma, um certo grau de cautela é imposto a ambos os lados."
Desde a invasão da Rússia à Ucrânia em 2022, Putin intensificou as ameaças de usar armas destrutivas caso o país enfrente uma ameaça existencial.
Tertrais permanece cético, dizendo que "se a Rússia realmente quisesse nos assustar, aumentando a ameaça nuclear, ela teria feito alguns movimentos incomuns, alguns exercícios incomuns. Mas esse não foi o caso."
"Sim, os riscos de mal-entendidos e incidentes mal gerenciados existem, mas não vejo motivo para acreditar que sejam maiores hoje do que eram há 10 anos, antes da invasão da Crimeia", afirmou.
Tertrais admitiu que regimes cada vez mais autoritários podem se tornar "ainda mais paranóicos".
Mas ele acrescentou: "Se há uma área em que a Rússia ainda se mostra razoável, são as armas nucleares, o que, na minha opinião, mostra que Putin não perdeu totalmente o contato com as realidades estratégicas."
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Fonte:https://insiderpaper.com/nuclear-threats-under-control-in-unstable-world-expert/
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