LDD, 10/04/2023
Os mercados começaram a reduzir sua posição de ativos em títulos bolivianos dolarizados com medo da desvalorização cada vez mais esperada. O câmbio fixo parece totalmente insustentável para um Banco Central sem reservas e sem credibilidade.
A crise cambial na Bolívia se intensifica a cada dia. As reservas internacionais informadas pelo Banco Central do país caíram abaixo de 700 milhões de dólares, o valor mais baixo dos últimos 19 anos. A situação é ainda mais dramática considerando que a autoridade monetária deixou de publicar estatísticas sobre suas reservas desde 8 de fevereiro.
A taxa de câmbio fixa com o dólar (cerca de 6,97 pesos por unidade desde 2008) foi mantida por mais de uma década com base no consumo constante de reservas (na ausência de controles cambiais), mas a situação chegou a um ponto crítico em que o desvalorização oficial parece imparável. O Banco Central não tem como continuar mantendo a paridade cambial em meio a uma corrida contra o peso.
As expectativas de desvalorização impactaram não apenas a demanda do varejo por dólares, mas também o mercado financeiro: os títulos soberanos em dólares bolivianos despencaram 44% em relação ao ano passado, e o índice Country Risk do JP Morgan subiu para 1.693 pontos base na quinta-feira.
De referir que uma das muitas considerações que o índice de risco JP Morgan tem em conta é o risco associado à desvalorização da moeda nacional, para além do risco de incumprimento ou default.
O Governo deve enfrentar um diferencial de quase 17% face à taxa de juro internacional de referência (a taxa dos títulos do Tesouro dos EUA), fenômeno este que afeta não só o financiamento do setor público como também o acesso ao mercado de capitais internacional por parte do sector privado.
A Bolívia agora ocupa o quarto lugar entre os países mais arriscados da América Latina, atrás apenas de Argentina, Venezuela e Equador. Um aumento de 1000 pontos é acumulado em relação às medições de apenas três meses atrás. A crise cambial se espalha muito rapidamente, enquanto os mercados buscam se desfazer de seus títulos em dólares bolivianos para migrar para ativos mais confiáveis.
A manutenção de uma taxa de câmbio fixa, num contexto de inflação moderada mas persistente desde 2010, funcionou como uma âncora para disciplinar as expectativas sobre a evolução futura dos preços, mas na medida em que o sistema não se sustenta, as expectativas podem tornar-se rapidamente desfavoráveis se um iminente desvalorização é descontada.
A Bolívia está a caminho de perder a estabilidade de preços do que o chamado “socialismo do século XXI” se vangloriava no país. As manifestas inconsistências do modelo econômico levaram à atual crise cambial.
O regime de Luis Arce tem duas opções: ou permitir que o peso flutue e desvalorizá-lo, ou introduzir controles de todos os tipos sobre transações em moeda estrangeira ou saques em dinheiro de instituições bancárias. A dramática expropriação dos fundos de pensão bolivianos só minou ainda mais a escassa credibilidade do governo socialista.
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