Balkaninsight, 27 de agosto de 2018
Por Marija Ristic
Postagens de mídia social dos campos de batalha ucranianos têm sido inestimáveis para permitir que promotores na Sérvia e Montenegro provem a ação militar ilegal de seus cidadãos na Ucrânia.
Marko Barovic esteve sempre do lado errado da lei. Crescendo em Montenegro, desde a adolescência, ele sempre saia com criminosos.
Mesmo depois dos 30 após uma condenação por roubo e tentativa de homicídio. Agora, desde abril deste ano, ele também tem uma condenação por participar de um conflito militar estrangeiro, na Ucrânia, que é proibido por lei em Montenegro.
Barovic está cumprindo sua pena de três anos e seis meses de prisão.
Em 2014, quando a guerra irrompeu na Ucrânia entre separatistas pró-russos no leste e combatente ucranianos, muitos simpatizantes russos dos Bálcãs, a maioria da Sérvia, ou sérvios da Bósnia e Herzegóvina e Montenegro, uniram-se a paramilitares pró-russos operando no leste da Ucrânia, principalmente na área de Donetsk.
De acordo com os registros do tribunal, Barovic viajou em dezembro de 2014 para a Rússia e, pouco antes do Ano Novo, para o leste da Ucrânia, onde obteve uma identificação militar da autoproclamada República Popular de Donetsk.
De acordo com o mesmo cartão militar, ele serviu inicialmente como motorista e depois como atirador de elite. Em outubro de 2015, no entanto, ele foi preso na fronteira entre a Ucrânia e a Rússia.
Os promotores montenegrinos dizem que a principal prova de que ele lutou na Ucrânia e não apenas dirigiu um caminhão, como alegou inicialmente no julgamento, era o seu perfil pessoal no Facebook.
Ele costumava postar fotos do campo de batalha de si mesmo de uniforme e segurando um rifle. Os posts e fotos, que eram públicos, foram admitidos como prova perante o tribunal em Podgorica.
Depois de ser confrontado com as provas, Barovic confessou que realmente passara o tempo na Ucrânia. No entanto, ele ainda defendia sua conduta. Ele disse que tinha ido lá para “ajudar as pessoas por razões morais e patrióticas”.
Os sérvios reuniram-se para ajudar os “irmãos russos”:
O veredito em abril deste ano contra Brovic foi uma condenação histórica no Montenegro, após a adoção de uma lei em 2015 que classificava a luta em território estrangeiro como crime.
Na vizinha Sérvia, no entanto, onde o número daqueles que lutaram na Ucrânia como combatentes estrangeiros era muito maior, houve tais julgamentos, mas apenas acordos de confissão.
Cerca de 24 combatentes que retornaram à Sérvia no ano passado da Ucrânia admitiram culpa depois que a promotoria apresentou evidências de sua presença nos campos de batalha. Os investigadores reuniram a maioria dessas evidências também examinando os seus perfis de mídia social.
Os acordos de confissão não são documentos públicos na Sérvia, mas fontes da BIRN dos escritórios do Ministério Público dizem que os vídeos do YouTube e as fotos do Facebook provaram ser a principal evidência na maioria dos casos.
O caso mais proeminente foi contra Radomir Pocuca, um ex-porta-voz especial da polícia, que durante vários meses de luta na Ucrânia postou vídeos quase diários, fotos e outros comentários sobre o tempo em que ficou em Donetsk.
Pocuca também afirmou que foi ajudar os “irmãos russos” da Sérvia por razões patrióticas, principalmente por conta do apoio da Rússia à Sérvia na disputa sobre a antiga província do Kosovo [que declarou a independência em 2008 – que a Sérvia prometeu nunca reconhecer].
Os sérvios também se lembram de que os combatentes russos se ofereceram para o lado sérvio na guerra de 1992-5 na Bósnia, que lançou os sérvios contra uma combinação de croatas e bósnios [bósnios muçulmanos].
Para muitos dos combatentes sérvios na Ucrânia, esta não foi a primeira guerra deles.
Ranko Momic, que se acredita ainda estar na Ucrânia, escapou do julgamento por supostos crimes de guerra no Kosovo e fugiu para Donetsk em 2015.
Um sérvio da Bósnia, ele também lutou na guerra contra o lado sérvio na Croácia no início dos anos 90, antes de participar da guerra na Bósnia, servindo nas chamadas unidades “especiais”, como a notória Guarda Voluntária Sérvia.
Mesmo durante a década de 1990, antes que os telefones celulares ou mídias sociais aparecessem, esses lutadores gostavam de ser fotografados ou filmados durante o período de batalha, e os tribunais locais e internacionais usavam esses registros para garantir condenações por crimes de guerra.
Entre os outros combatentes sérvios mais conhecidos na Ucrânia, com experiência na guerra da Bósnia, está Dejan Beric.
Ele foi recentemente visto novamente na área de Donetsk com um novo grupo de atiradores sérvios.
Beric foi criado em Putinci, uma vila no norte da Sérvia, onde dirigiu um negócio de portas e janelas na cidade vizinha de Indjija antes de fechar o seu negócio em 2014 e partir para a Ucrânia.
Muitos voluntários dos Bálcãs dizem que se juntaram aos rebeldes por uma profunda solidariedade à Rússia e um senso de irmandade cristã ortodoxa eslava.
Mas Beric disse que também foi para lá depois de ter sido pessoalmente convidado por dois voluntários russos que lutaram nas guerras dos Bálcãs nos anos 90.
“Eles me pediram para pagar a dívida, em termos de espírito moral e humano”, disse Beric à BIRN no início deste ano em uma entrevista.
Ao contrário de alguns relatos publicados na Internet, Beric disse que se tornar voluntário é simples; os supostos combatentes precisam apenas pegar um avião para Rostov-on-Don na Rússia e depois pegar um ônibus do outro lado da fronteira para Donetsk ou Lugansk, na Ucrânia.
“Eu vim de Sochi, onde trabalhei, via Odessa para Sevastopol, onde me tornei um membro da ‘Defesa de Sevastopol’… Depois fui ao Donbass”, lembrou Beric.
Beric também atualiza regularmente sua conta no Facebook e no YouTube com histórias do campo de batalha.
Muitos lutadores continuam em fuga:
Os perfis das redes sociais não só ajudaram as autoridades da Sérvia e Montenegro a garantir as condenações; as autoridades ucranianas também as usaram para emitir mandados de prisão contra os restantes dos combatentes sérvios no país.
O serviço de segurança da Ucrânia emitiu mandados de prisão contra seis mercenários sérvios, enquanto as autoridades de Kiev afirmam que quase 300 sérvios continuam lutando em várias áreas rebeldes.
Os seis sérvios, segundo o serviço de segurança da Ucrânia, lutaram na Ucrânia em 2014 e depois na Síria – outra zona de conflito em que a Rússia está profundamente envolvida – em 2015.
Todos os seis supostamente pertencem à Wagner, uma empresa militar registrada na Argentina, que, segundo o serviço de segurança ucraniano, serve como uma unidade paramilitar encarregada de lutar pelos interesses russos em todo o mundo.
Entre os seis lutadores procurados pela Ucrânia está em Davor Savicic “Elvis”, um sérvio da Bósnia, que afirma viver na Rússia e trabalhar em um canteiro de obras.
Savicic teria sido altamente apreciado por seus superiores em Wagner devido a sua extensa experiência no campo de batalha, e recebeu o codinome “Wolf” para refletir sua força e coragem no combate.
Embora essas afirmações não pudessem ser verificadas independentemente, a foto do perfil do Savicic no Facebook também é, por coincidência, um lobo.
A polícia bósnia disse ao BIRN que eles acreditam que os mercenários têm um ponto de encontrou em Moscou, e que a maioria deles está registrado como trabalhadores temporários na Rússia, a fim de evitar processos em casa como combatentes estrangeiros.
Os registros da polícia sugerem que Savicic pertencia anteriormente a várias unidades sérvias bósnias, e passou muito tempo lutando ao lado dos chamados tigres, uma unidade paramilitar notória liderada por Zeljko Raznatovic “Arkan”.
Aquele que foi morto em 2000 antes de ser julgado por crimes de guerra pelo tribunal penal internacional da ex-Iugoslávia, o ICTY, em Haia.
Em 2001, a promotoria montenegrina acusou Savicic e três outros de plantar uma bomba na casa de Dusko Martinovic, na cidade de Barane, que matou seis pessoas. Martinovic supostamente devia cerca de 15.000 euros.
Savicic foi inicialmente preso e condenado por 20 anos em Absentia em Montenegro, mas um tribunal de apelação decidiu mais tarde que não havia provas suficientes para provar que ele era responsável pelo atentado.
De 2001 até sua absolvição em 2014, a polícia montenegrina o seguiu [seus rastros] da Bósnia para a França, Espanha e Rússia, mas nunca conseguiu prendê-lo.
No mesmo ano em que Savicic foi liberado, fotografias dele na linha de frente em Lugansk apareceram, depois que ele e cerca de 50 outros combatentes sérvios trouxeram suas habilidades no capo de batalha para ajudar rebeldes pró-russos contra o governo ucraniano, segundo a promotoria bósnia.
A Rússia parece tê-los implantando usando métodos semelhantes aos da Sérvia usados na guerra da Bósnia, quando a Sérvia negou qualquer envolvimento direto no conflito e insistiu que todos os cidadãos sérvios que participam eram voluntários. A Rússia fez o mesmo na Ucrânia.
Combatentes de Wgner também lutaram pelo aliado sírio da Rússia, o presidente Assad, e embora muitos deles tenham negado as reportagens, notícias da Síria sugerem que alguns deles perderam suas vidas lutando contra os inimigos jhadistas de Assad.
Entre eles estava Dimitrije Sasa Jojic, cuja morte aos 25 anos foi anunciada em junho pelo grupo sérvio de futebol Firma, ao qual Jojic pertencia antes de se tornar um mercenário estrangeiro.
Jojic também lutou inicialmente na Ucrânia e esteve ativo nas redes sociais, posando de uniforme e com outros lutadores.
Acredita-se que ele fazia parte do mesmo grupo de Wagner que foi para a Síria. Jojic foi enterrado em Moscou neste verão.
Acredita-se que outros combatentes sérvios, supostamente membros de Wagner, e também procurados pela Ucrânia estejam na Rússia, viajando ocasionalmente para as áreas controladas pelos rebeldes da Ucrânia. Todos eles têm passaportes sérvios ou bósnios.
Ao contrário de Barovic ou Pocuca – que foram extraditados da Ucrânia e da Rússia – os homens de Wagner são vistos como muito mais importantes para os dois lados do conflito.
Eles são importantes para a Rússia, pois seus métodos lançam luz sobre as formas ocultas como a Rússia exporta combatentes para a zona de conflito.
Eles são igualmente importantes para a Ucrânia, que os responsabiliza por numerosos ataques que mataram centenas de pessoas.
Em consequência, como especialistas em segurança disseram à BIRN, sua extradição e prisão é altamente improvável.
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Excelente reportagem sobre o assunto!
ResponderExcluirParabéns aos editores e autores!
Obrigado Luana! É "autor", eu sou o exército de um homem só. Esse blog segue publicando aos trancos e barrancos. Mas é uma iniciativa pessoal minha que muito me orgulha.
ExcluirEu conheço um pouco das artimanhas da Rússia. Sou anti-Putin, e procuro sempre esclarecer o que o tirano tem feito no leste, e como ele age hoje para enganar o Ocidente. Estou com o povo da Ucrânia, e com os sérvios patriotas de verdade, que não se vendem para as mentiras e artimanhas de Putin, e não querem ver seu país sob a égide dese tirano.