Euronews, 06 de setembro de 2016.
Sexta-feira foi a segunda vez em 48 horas que Mariano Rajoy tentou que o parlamento espanhol aprovasse o governo, sem sucesso. Rajoy dirige um governo de gestão há 8 dias. Para a aprovação, precisava de 11 abstenções.
Mas os 180 deputados que tinham votado contra da primeira vez, incluindo o PSOE e o Podemos, voltaram a votar contra. Os 170 votos a favor, vindos do PP e do Ciudadanos, não foram suficientes para formar governo. Desde Dezembro, os espanhóis foram já duas vezes às urnas.
O politólogo Fernando Vallespín explica à euronews esta situação sem precedentes em Espanha. Para já, o que prevê a constituição é o seguinte: “Abre-se uma nova fase, que pode durar no máximo dois meses, para que as forças políticas tentem chegar a um acordo diferente do que propôs Rajoy. O líder da oposição, Pedro Sánchez, os socialistas ou outros grupos podem por-se em marcha para que outro candidato se apresente à investidura. Ou até o próprio Rajoy. Mas penso que só o vai fazer se tiver a certeza que consegue”, explica.
Uma das certezas é que nada vai mudar até 25 de setembro, data das eleições regionais na Galiza e no País Basco. Os resultados podem reforçar ou enfraquecer o partido de Rajoy, o PP, de centro-direita.
Fernando Vallespín: “As eleições no País Basco e na Galiza, de certa forma, vão impedir os partidos e grupos políticos de chegar a acordo até que acabem, porque entramos num período de campanha eleitoral nesses sítios. São duas regiões muito sensíveis. Numa delas, a Galiza, o PP é dominante. No País Basco, tanto o Podemos como os nacionalistas têm uma grande presença”.
No poder desde 2011, depois de ter ganho as eleições de dezembro e junho, Rajoy insiste no direito de governar. O partido mostra união face ao candidato. Por que razão Rajoy não consegue encontrar apoio suficiente nas outras forças políticas? Vallespín explica: “O PP é o único partido do sistema político espanhol que não se renovou desde a crise política em Espanha – Crise política, produto da crise económica. Nesse sentido, Rajoy está assinalado. Ele é o responsável máximo de um partido onde há muita gente a ser julgada por crimes de corrupção. O que não facilita que se faça pactos com eles.”
O panorama político de Espanha viu, nos últimos anos, o surgimento de dois partidos. O Podemos, à esquerda e o Ciudadanos, centrista. A aparição destes partidos pôs fim à tradição de maiorias absolutas do PP ou do PSOE, que continuam a ser os partidos principais, embora enfraquecidos.
FV: “Só a figura de Rajoy vai conseguir desbloquear o apoio ao Partido Popular. O PP não vai prescindir de Rajoy como candidato à presidência do governo, não tenho a mínima dúvida. Por isso, por aí não há possibilidade de conseguir a investidura. Mesmo se o PSOE quiser fazer algo em conjunto com o Podemos, e ao que parece o Podemos prestar-se-ia a isso, ficaria longe dos números necessários para ter uma maioria. Ou seja, há uma situação de bloqueio perfeito”.
Além do panorama político diferente, com o aparecimento dos novos partidos, uma reforma do sistema eleitoral pode vir a acentuar ainda mais este multipartidarismo. A solução parece ser criar uma cultura de pactos políticos, a que a Espanha ainda não está habituada: “A reforma do sistema eleitoral em Espanha vai por outro caminho. A maioria das forças políticas está a favor de uma reforma que favoreça ainda mais a proporcionalidade. Temos de entrar numa cultura de pactos, o que ainda não existe em Espanha. Há a nível regional e local, mas não a nível nacional. Devemos favorecer a criação dessa cultura e devemos, sobretudo, voltar a adaptar a política real às novas condições sociológicas do país, que provocaram esta situação”, conclui Vallespín.
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