4 de ago. de 2016

França: Depois do Terceiro Ataque Jihadista

O exército francês está no limite de sua capacidade de ação: ele já patrulha as ruas da França e está posicionado na África e no Oriente Médio. Foto: soldados franceses protegem uma escola judaica em Estrasburgo, fevereiro de 2015




Gatestone, 04 de agosto de 2016. 







  • Sucessivos governos franceses montaram uma armadilha; os franceses, que estão dentro dela, pensam apenas em uma maneira de escapar. A situação é bem mais grave do que muitos imaginam. Regiões inteiras da França estão sob controle de gangues e imãs radicais.
  • O Primeiro Ministro Manuel Valls repetiu o que já havia dito há 18 meses: "a França está em guerra." Ele identificou o inimigo: "islamismo radical", mas logo se apressou acrescentando que o "islamismo radical" "nada tem a ver com o Islã." Ele então repetiu a mesma ladainha enfatizada em tantas ocasiões: os franceses terão que se acostumar a conviver com a "violência e com os ataques".
  • Os franceses estão ficando cada vez mais cansados das tentativas de exonerar o Islã. Eles sabem muito bem que nem todos os muçulmanos são culpados. Eles também sabem que todos que cometeram atentados na França nos últimos anos eram muçulmanos. Os franceses não querem de jeito nenhum se acostumar com "violência e ataques." Eles não querem estar no lado dos derrotados e já sentem que estão sendo derrotados.

Nice, 14 de julho de 2016: Dia da Queda da Bastilha. As festividades da noite estavam chegando ao fim. Conforme a multidão assistia a queima de fogos de artifício começava a se dispersar, o motorista de um caminhão de 19 toneladas, dirigindo em zigue-zigue, atropelava todos que estavam em seu caminho. Dez minutos mais tarde, após ter assassinado 84 pessoas, ele foi baleado e morto. Dezenas ficaram feridas; muitos ficarão aleijados para o resto da vida. Sobreviventes atordoados vagavam pelas ruas da cidade durante horas.

Âncoras das redes de notícia da televisão francesa se apressaram em realçar que, com certeza, se tratava de um "acidente", quando as autoridades francesas começaram a falar de terrorismo, ressaltaram que o motorista só podia ser um louco. Quando a polícia divulgou o nome e a identidade do assassino, e que no passado ele já tinha estado em depressão, ela aventou que ele poderia ter atuado em um rompante de "alta ansiedade". Os policiais entrevistaram testemunhas que atestaram que ele "não era um muçulmano devoto" -- talvez nem sequer muçulmano.
O Presidente François Hollande fez um pronunciamento algumas horas mais tarde afirmando sua determinação em "proteger a população."

O Primeiro Ministro Manuel Valls repetiu o que já havia dito há 18 meses: "a França está em guerra." Ele identificou o inimigo: "islamismo radical", mas logo se apressou acrescentando que o "islamismo radical" "nada tem a ver com o Islã." Ele então repetiu o que já havia enfatizado em tantas ocasiões: os franceses terão que se acostumar a conviver com a "violência e com os ataques".

A reação popular mostrou que Valls não convenceu praticamente ninguém. Os franceses estão ficando cada vez mais cansados das tentativas de exonerar o Islã. Eles sabem muito bem que nem todos os muçulmanos são culpados. Eles também sabem que, no entanto, todos que cometeram atentados na França nos últimos anos eram muçulmanos. Eles não se sentem protegidos por François Hollande. Eles estão vendo que a França está sendo atacada com mais intensidade e que o Islã radical declarou guerra, mas não estão vendo a França reagir também declarando guerra ao Islã radical. Eles não querem de jeito nenhum se acostumar com "violência e ataques". Eles não querem estar no lado dos derrotados e já sentem que estão sendo derrotados.

Pelo fato do partido Frente Nacional usar uma linguagem mais robusta, boa parcela dos eleitores votarão em seus candidatos. A líder da Frente Nacional Marine Le Pen, vencerá, sem a menor sombra de dúvida, o primeiro turno da eleição presidencial no próximo ano. Ela provavelmente não será eleita no segundo turno, mas se nada for feito rápida e inequivocamente, ela terá boa chance da próxima vez.

Os políticos moderados leem as pesquisas de opinião, endurecem a sua retórica e recomendam políticas mais duras. Alguns podem exigir medidas mais duras, tais como a expulsão de terroristas detidos que têm dupla cidadania e a detenção daqueles que defendem os ataques. Há outros que até já pediram a instauração da lei marcial.

A calma voltará gradualmente, mas não há dúvida que a situação na França está se aproximando do ponto de ebulição.

Os recentes ataques serviram de catalisador. Quatro anos atrás, quando Mohamed Merah assassinou soldados e judeus em Toulouse, a população não reagiu. A maioria dos franceses não se sentiu diretamente afetada; soldados eram apenas soldados e judeus eram apenas judeus. Quando em janeiro de 2015 os cartunistas da redação da revista Charlie Hebdo foram massacrados, uma reação emocional tomou conta do país, desaparecendo logo em seguida. Foi organizada uma grande manifestação em nome da "liberdade de expressão" e dos "valores da república". Centenas de milhares entoavam palavras de ordem: "Je Suis Charlie" ("Eu sou Charlie"). Dois dias depois, novamente quando judeus foram assassinados em uma mercearia kasher, praticamente ninguém disse: "Eu sou Judeu."

Aqueles que tentaram se pronunciar sobre a jihad foram imediatamente silenciados. Nem mesmo um ano depois, em novembro, quando do banho de sangue na casa noturna Bataclan não motivou protestos mas causou um choque profundo. A grande mídia e o governo já não podiam mais esconder que se tratava de um ato de jihad. O número de mortos era tremendamente alto; já não era mais possível simplesmente seguir adiante. A grande mídia e o governo fizeram o máximo para minimizar a raiva e a frustração e maximizar a tristeza. Cerimônias solenes com flores e velas estavam por toda parte. Foi declarado "estado de emergência" e soldados foram para as ruas.

Então a sensação do perigo foi se esvaecendo. O campeonato de futebol Euro 2016 foi organizado na França e o bom desempenho da equipe francesa criou uma falsa sensação de união.

O ataque em Nice foi mais um sinal de alerta. Ele lembrou, de forma brutal, a todos que o perigo ainda estava presente, mais mortal do que nunca, e que as medidas tomadas pelas autoridades não passavam de gesticulações inúteis. Voltaram as lembranças das mortes anteriores.

Esforços para esconder que Mohamed Lahouaiej-Bouhlel, o terrorista de Nice, era jihadista não enganava mais ninguém. Apenas enfureceu mais, frustrou mais e aumentou o desejo para que houvesse uma atuação eficiente.

Dias antes do ataque em Nice, a mídia informou que o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o ataque à casa noturna Bataclan revelou que as vítimas foram brutalmente torturadas e mutiladas e que o governo tentou encobrir os fatos. Agora o público inteiro descobriu a extensão do horror, colocando mais lenha na fogueira.

Parece que agora a França está à beira de um momento revolucionário; não irá demorar muito para que haja uma explosão. A situação é muito mais grave do que muitos imaginam.

Regiões inteiras da França estão sob controle de gangues e imãs radicais. O governo delicadamente as chama de "zonas urbanas sensíveis". Em outros lugares são chamadas, franca e diretamente, de "zonas proibidas." Há mais de 570 delas.

Centenas de milhares de jovens muçulmanos vivem naquelas regiões. Muitos são bandidos, traficantes de drogas e ladrões. Outros tantos alimentam um ódio profundamente enraizado pela França e pelo Ocidente. Os recrutadores de organizações jihadistas dizem a eles, diretamente ou através das redes sociais, que se matarem em nome de Alá obterão o status de mártires. Centenas estão a postos. Eles são granadas sem o pino de segurança que podem explodir em qualquer lugar, a qualquer momento.

Embora a posse, transporte e venda de armas sejam rigorosamente regulamentadas na França, armas de guerra circulam livremente. E obviamente o ataque em Nice demonstrou novamente que não há necessidade de arma de fogo para se cometer assassinato em massa.

Vinte mil pessoas estão na lista dos "arquivos-S" do governo, um sistema de alerta para identificar indivíduos ligados ao Islã radical. A maioria não é monitorada. Mohamed Merah o assassino de Toulouse, os assassinos dos cartunistas da revista Charlie Hebdo e muitos dos terroristas que atacaram a casa noturna Bataclan constavam dos arquivos-S. Mohamed Lahouaiej-Bouhlel, o terrorista que atacou em Nice, não estava na lista.

O chefe de inteligência da França ressaltou recentemente que mais ataques estão por vir e que muitos assassinos em potencial perambulam livremente, sem serem detectados.

Fazer o que o governo francês está fazendo hoje não vai ajudar em nada. Muito pelo contrário. A França está à mercê de outro ataque que irá incendiar o barril de pólvora.

Fazer mais do mesmo irá piorar as coisas antes que elas melhorem. Reconquistar o controle de muitas regiões acarretará mobilizar o exército; os esquerdistas e anarquistas com certeza se empenharão em aumentar ainda mais a desordem.

Colocar na prisão qualquer um que tenha algum motivo de estar preso em nome da segurança pública implicaria em algo mais do que a lei marcial; seria a suspensão das liberdades democráticas e mesmo assim seria uma tarefa impossível. As prisões da França já estão lotadas. A polícia está em desvantagem numérica, dando sinais de esgotamento. O exército francês está no limite da sua capacidade para a ação: ele já patrulha as ruas da França e está posicionado na África e no Oriente Médio.




Sucessivos governos montaram uma armadilha; os franceses, que estão dentro dela, pensam apenas em uma maneira de escapar.

Os responsáveis por isso são o Presidente François Hollande e o Primeiro Ministro Manuel Valls. Por anos a fio, muitos na França apoiaram qualquer movimento que condenasse o "racismo islamofóbico". Eles aprovaram leis definindo críticas ao Islã como "crime de ódio". Eles dependiam cada vez mais do voto muçulmano para vencer eleições. O mais importante instituto interdisciplinar de estudos de esquerda da França, Terra Nova, considerado próximo ao Partido Socialista, publicou vários levantamentos explicando que a única maneira da esquerda vencer eleições é atrair os votos dos imigrantes muçulmanos e incluir mais muçulmanos na população do país.

A direita moderada também é culpada. O Presidente Charles de Gaulle criou a "política árabe da França", um sistema de alianças com algumas das piores ditaduras árabes-muçulmanas do mundo, na crença de que a França iria recuperar seu poder graças a este sistema. O Presidente Jacques Chirac seguiu os passos de Charles de Gaulle. O Presidente Nicolas Sarkozy ajudou a derrubar o regime de Gaddafi na Líbia e carrega enorme responsabilidade pelo caos que se seguiu.

Há uma década a armadilha revelou seus efeitos letais. Em 2005 distúrbios em toda a França mostraram que as manifestações muçulmanas poderiam levar a França à beira da destruição. O incêndio foi extinto graças aos apelos de organizações muçulmanas pedindo calma. Desde então a França ficou à mercê de mais distúrbios.

A opção foi a de apaziguamento. O que não impediu a deterioração de ganhar terreno.

François Hollande tomou decisões precipitadas que colocaram a França no olho do furacão. Percebendo que os interesses estratégicos da França corriam perigo, lançou operações militares contra grupos islamistas na África Subsariana. Notando que muçulmanos franceses estavam indo treinar e participar ativamente da jihad na Síria, ele decidiu usar o exército francês em ações contra o Estado Islâmico.

Ele não previu que grupos islâmicos e o Estado Islâmico iriam retaliar e atacar a França. Ele não percebeu a extensão da vulnerabilidade da França, exaurida por dentro.

As consequências expuseram à luz do dia um cenário assustador. O islamitas viram o cenário e não deixaram de gostar do que viram.

Em seus Websites, eles muitas vezes citam uma mensagem de Osama bin Laden: "quando as pessoas veem um cavalo forte e um cavalo fraco, naturalmente irão querer ficar com o cavalo forte."

Ao que tudo indica eles acreditam que a França é um cavalo fraco e que o Islã radical pode fazer a França ficar de joelhos em cima de um amontoado de poeira e escombros. Também parece que eles acreditam que o tempo está a favor deles -- assim como a demografia. Os muçulmanos já compõem cerca de 10% da população francesa; 25% dos adolescentes na França são muçulmanos.

O número de muçulmanos franceses que querem a Lei Islâmica (Sharia) implementada na França cresce ano a ano, bem como o número de muçulmanos franceses que aprovam a jihad violenta. Franceses em número cada vez maior deploram o Islã, mas estão tomados pelo medo. Até mesmo os políticos que parecem estar prontos para lutar não mexem com o Islã.

Ao que tudo indica os islamitas acreditam que nenhum político francês irá superar o que mais parece uma perfeita tempestade árabe. Eles parecem ter a sensação de que o Ocidente já está derrotado e não tem mais condições de levar a melhor. Eles estão errados?


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