11 de jun. de 2016

EUA se preparam para combater desinformação russo-chinesa





EpochTimes, 08 de junho de 2016. 








Essa táctica é vista como ameaça à segurança nacional e democracia dos Estados Unidos

Num vídeo de setembro de 2015, um homem vestido como soldado dos EUA aparece portando um fuzil Saiga 401K de fabricação russa e dispara três tiros contra uma cópia do Alcorão, o livro sagrado do Islã.

O vídeo foi amplamente divulgado nas comunidades muçulmanas da Rússia, provocando protestos contra os Estados Unidos e suas tropas. Esse ato intensificou os profundos sentimentos anti-americanos já existentes na comunidade mulçumana mundial, algo semelhante a quando o pastor do estado da Flórida, Terry Jones, queimou um Alcorão em 2011, o que gerou distúrbios no Afeganistão, causando 11 mortes durante manifestações.
Entretanto, o vídeo do soldado era falso. Sua origem, de acordo com uma investigação da BBC, não era outro senão o próprio escritório de desinformação russa, a Agência de Estudos da Internet, também conhecida como “fábrica de trolagem”.

Outras histórias falsas, destinadas a manchar a imagem dos Estados Unidos, foram recentemente atribuídas a essa agência russa. Em junho de 2015, o New York Times Magazine descobriu que a agência também foi responsável pela produção de outras falácias, incluindo histórias sobre uma empresa química da Louisiana que estaria emanando gases tóxicos e outra alegando que havia um surto de Ebola em Atlanta, ambos situados nos EUA.




A utilização da desinformação é uma ferramenta comum de governos ditatoriais e totalitários. Para eles, a notícia é uma arma, e a utilizam para sustentar seus regimes e para atacar adversários. Entretanto, os Estados Unidos, em breve, podem contra-atacar a desinformação com uma nova iniciativa.

Em 16 de maio deste ano, um projeto de lei bipartidário chamado “Ato de Contra-Informação de Guerra” foi apresentado ao Senado dos EUA. O projeto foi produzido pelo Senador Rob Portman (Republicano) e co-patrocinado pelo Senador Christopher Murphy (Democrata). O documento já foi discutido duas vezes e enviado à Comissão de Relações Exteriores.

O projeto declara claramente que certos governos estrangeiros, incluindo a Rússia e a China “usam a desinformação e outras ferramentas de propaganda para prejudicar a segurança nacional dos Estados Unidos e de seus aliados”.

O Sen. Portman enfatizou a importância do projeto de lei durante um encontro do instituto de reflexão Atlantic Council em 12 de maio. Ele afirmou: “A China gasta anualmente bilhões na produção de propaganda para o estrangeiro, enquanto a Russia Today (RT), uma mídia internacional do estado russo, supostamente investe 400 milhões de dólares por ano, apenas em seu escritório de Washington [capital dos EUA].”

A RT alega que o orçamento da mídia para 2016 é de somente 17 bilhões de rublos (cerca de 253 milhões de dólares), e Portman acusou a RT de gerar desinformação. Entretanto, o jornal The Moscow Times publicou em setembro de 2014 que o financiamento da estatal russa foi de 310 milhões de dólares em 2014 e $400 milhões de dólares em 2015.

A fonte de Portman é um relatório de abril de 2015 da Fundação Heritage, que afirma: “Supostamente, a RT tem um orçamento de 400 milhões de dólares destinado apenas para sua sucursal de Washington.” A fonte é um relatório de 2014 da Comissão Consultiva dos Estados Unidos em Diplomacia Pública, que alega: “A Rússia gasta mais de $ 1  bilhão de dólares por ano para financiar a infraestrutura de desinformação e contra-narrativas que apoiam sua política externa.”

Os danos causados pela desinformação não podem ser subestimados, e essa tática de propaganda é uma séria ameaça para a democracia, de acordo com Ronald J. Rychlak, professor de direito na Faculdade de Direito da Universidade do Mississippi.

Rychlak co-escreveu o livro “Desinformação” com o tenente-general Ion Mihai Pacepa, o funcionário de mais alto escalão da inteligência soviética que já desertou para o Ocidente. Os dois detalharam muitas das falsas narrativas espalhadas pelos soviéticos, que hoje são tidas como verdades por muitas pessoas.

“Somos uma sociedade [os EUA] baseada na livre informação, onde as pessoas confiam na informação para tomarem decisões”, e este sistema é prejudicado quando governos estrangeiros espalham intencionalmente informações falsas para enganar as pessoas, disse Rychlak, em entrevista ao Epoch Times.

“É importante que as pessoas tomem consciência disso e, de alguma forma, contra-ataquem, porque se pode corromper um sistema inteiro desde seu interior fornecendo informações desse tipo”, acrescentou Rychlak.

Enganar como estratégia

A desinformação é uma forma particularmente desonesta de propaganda. O método consiste em fabricar notícias, muitas vezes com um fragmento de verdade, mas com um enredo falso. Outro método é fabricar acontecimentos, como o falso vídeo do soldado atirando contra o Alcorão, disseminá-lo em diferentes canais, como as redes sociais, e apresentá-lo ao público-alvo, como as comunidades mulçumanas.




Todavia, esta tática não se detem na criação de falácias. Em oposição a propaganda convencional, que normalmente é transmitida por porta-vozes de um governo, um dos objetivos chaves da desinformação é fazer com que especialistas e veículos de comunicação espalhem a mentira de forma espontânea.

Desta forma, histórias falsas adquirem vida própria e um verniz de credibilidade. Logo que uma mídia ou um especialista abracem a desinformação, o governo que a criou pode utilizá-los como fontes em seus relatos. Assim, um funcionário do governo que gerou a falácia aparece para condenar publicamente o país, organização ou pessoa que foi alvo da desinformação, citando em seu relatório as repercussões geradas na mídia, o que incita outros veículos a também reportarem sobre o acontecimento.

Após o sentimento público se elevar, os líderes locais que foram atacados são forçados a se posicionar. Cada nova notícia ou manifestação faz com que a falácia crie raízes cada vez mais profundas. O objetivo final é fazer com que a desinformação seja tomada como conhecimento comum, como verdade.

Rychlak disse que, quando se chega a esse ponto, a desinformação “torna-se parte da nossa cultura, parte do conhecimento assumido, e é por isso que a desinformação tem sido uma ferramenta muito eficaz para os nossos inimigos.”

O regime chinês tem usado essa tática para justificar muitas das suas violações aos direitos humanos.

Em 23 de janeiro de 2001, cinco chineses atearam fogo em si mesmos na Praça Tiananmen em Pequim. Os canais de notícias estatais do regime chinês afirmaram que os indivíduos eram praticantes do Falun Gong (uma prática milenar de qigong). Esse incidente foi usado pelas autoridades chinesas para validar a perseguição à prática, que começou oficialmente em 1999, mas que tinha baixo apoio popular, devido à grande popularidade do Falun Gong, principalmente na China.

O incidente foi rapidamente desmascarado como sendo encenado pelas autoridades chinesas. O Washington Post investigou dois dos indivíduos envolvidos no episódio e relatou em fevereiro de 2001 que ninguém nunca tinha visto essas pessoas praticando o Falun Gong. Um vídeo premiado chamado “Fogo Falso” (False Fire) também expôs as inúmeras brechas na cobertura de TV divulgada pelo Partido Comunista Chinês, incluindo como um agente da polícia chinesa golpeou a cabeça de uma das vítimas com um objeto, causando sua morte.

Apesar da “autoimolação” ter sido desmascarada, ainda hoje algumas agências de notícias citam o incidente, alimentando assim a desinformação do regime chinês. De acordo com o Centro de Informações do Falun Dafa nos EUA, as autoridades chinesas utilizam o episódio forjado “como pretexto para levar a cabo a violência sistemática e prisões extrajudiciais contra os praticantes do Falun Gong, o que levou a um aumento no número de mortes devido a torturas e abusos sob custódia.”

O regime chinês também utiliza constantemente a desinformação em suas operações para minar a força dos Estados Unidos e sua influência global. A mídia The Diplomat relatou em dezembro de 2015 que o Partido Comunista Chinês tem vários sistemas para conduzir essas operações, incluindo a política das “Três Guerras”, ou seja, guerra jurídica, psicológica e midiática; operações militares chamadas de “poder suave” — uma abordagem persuasiva nas relações internacionais, geralmente envolvendo o uso de influência econômica ou cultural — empregadas pelo Departamento de Política Geral; e através de operações de espionagem.

A estratégia das “Três Guerras” criou um ambiente de legitimidade para tomada territorial pelo regime chinês no Mar do Sul da China e em outras operações militares, e ao mesmo tempo tinha o objetivo de invalidar as iniciativas militares de outras nações.

De acordo com o think tank Instituto Projeto 2049, o foco do projeto de lei é combater a propaganda chinesa primeiramente dentro do território dos Estados Unidos. “O Pentágono tem conhecimento das capacidades da China de disseminar a desinformação há mais de uma década, porém atualmente não existe uma única organização governamental dos EUA que assuma o papel de desenvolver uma estratégia para combater a ameaça da guerra de informação.”

O projeto de lei afirma que a Rússia tem utilizado incisivamente a desinformação para avançar seus “objetivos políticos, econômicos e militares na Ucrânia, Moldávia, Geórgia, nos Balcãs, e na Europa Central e Oriental.”

O novo projeto de lei visa combater a guerra de informação, especialmente as campanhas de desinformação que ameaçam a segurança nacional dos Estados Unidos e de seus aliados, mas também tem o objetivo de “proteger e promover uma imprensa livre, saudável e independente em países vulneráveis a desinformação estrangeira.”

A guerra das palavras

Se a lei for aprovada, isso permitirá a criação de um novo escritório sob a supervisão do Departamento de Estado Americano encarregado de identificar a desinformação e expô-la publicamente.

Entretanto, de acordo com William Triplett, um veterano da Casa Branca da era Reagan e membro da comunidade de inteligência americana, o projeto de lei pode encontrar pedras no caminho.

O problema, afirma Triplett, é que qualquer coisa que visa expor a desinformação, em particular a chinesa, afetará inúmeras organizações que recebem dinheiro da China, quer sejam organizações de notícias através de anúncios pagos — como as inserções publicitárias do China Daily (o principal jornal em inglês do regime chinês) no New York Times e Washington Post —; empresas com interesses financeiros na China; ou agentes pagos do regime chinês que trabalham infiltrados nos diversos níveis da sociedade norte-americana.

Triplett vê o projeto como algo importante, mas observa que é necessário mais músculo por trás dele para romper a resistência.

Rychlak também concorda que os esforços para combater a desinformação são importantes, todavia, ele também expôs algumas preocupações. Para ele, o problema não é a aprovação do projeto de lei, mas sim os seus efeitos colaterais.

Segundo ele, caso o governo dos EUA criem um escritório ad hoc para identificar e combater a desinformação, essa entidade “será o primeiro alvo que nossos inimigos tentarão conquistar.”

Ele acrescenta que também é perigoso ter um escritório com autoridade para dizer o que é uma informação verdadeira e o que não é.

Rychlak acredita que, “Se quisermos ser uma nação que repousa sobre o ideal de uma população informada para que possa tomar suas próprias decisões, é preciso existir a capacidade de ver através da mentira, porém isso é algo que a maioria das pessoas não têm a capacidade ou recursos de fazer. ”

Caso a lei seja aprovada, no prazo de 180 dias subsequentes à aprovação, se estabeleceria um Centro de Análise da Informação e Resposta, em coordenação com o Secretário de Estado, o Secretário de Defesa, o Diretor de Inteligência Nacional, o Conselho de Radiodifusão dos Governadores, dentre outros.

A nova secretaria teria então a tarefa de reconhecer e combater a desinformação, e encontrar maneiras de trabalhar essa estratégia em nível nacional. Ela também possuiria um orçamento de 20 milhões de dólares para distribuir entre jornalistas, ONGs, empresas privadas e acadêmicos que ajudariam nos esforços de combater as falácias.

E também teria o objetivo de mapear os sistemas utilizados por outras nações para produção da desinformação — think tanks, partidos políticos, ONGs etc. — e de identificar espiões especializados em “influenciar populações e governos”.

Embora o conceito da desinformação possa parecer exagerado, ele é uma realidade antiga. Essa tática é utilizada desde os primórdios da ex-União Soviética. Em junho de 2010, o FBI prendeu 10 espiões do Serviço de Inteligência Exterior da Rússia que tentavam se infiltrar nos EUA através de think tanks e organizações não governamentais.

O Epoch Times há anos vem expondo vários programas de espionagem chinesa projetados para operações de influência e desinformação. Michel Juneau-Katsuya, o ex-chefe do escritório da Ásia-Pacífico para o Serviço de Inteligência de Segurança Canadense, disse ao Epoch Times em junho de 2015 que “o número de espiões e agentes de desinformação que têm sido espalhados pelo mundo na última década é enorme, absolutamente inacreditável. Isso nunca foi visto na história humana.”


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