Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, encontrou-se ontem com a primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon. Não será fácil o abraço da Escócia à UE |
DN, 30 de junho de 2016.
Por José Fialho Gouveia.
Intransigência dos líderes europeus reforça a probabilidade de um segundo referendo pela independência em relação ao Reino Unido.
E de repente Espanha transformou-se na grande barreira. "Quero ser muito claro. A Escócia não tem poderes para negociar com a União Europeia. Espanha opõe-se a qualquer negociação que não seja com o governo do Reino Unido. Se o Reino Unido sai, a Escócia sai", afirmou ontem o primeiro-ministro espanhol Mariano Rajoy.
Mesmo que os líderes europeus conseguissem encontrar uma forma de contornar as leis para que os escoceses pudessem continuar, as intenções esbarrariam na intransigência de Espanha. Rajoy não o disse, mas é óbvio que o objetivo da sua assertividade é não abrir um precedente que possa ser útil para os independentistas da Catalunha.
De Espanha não sopram bons ventos para o casamento da Escócia com a UE. E de França também não. Hollande, por outras palavras, disse o mesmo que Rajoy. "As negociações serão com o Reino Unido e não com uma parte do Reino Unido", assegurou o presidente francês.
A política pode sempre dar muitas voltas, mas parece que a única alternativa que resta à Escócia para se manter na União Europeia é convocar um novo referendo para tentar cortar o cordão umbilical com o Reino Unido e depois apresentar uma candidatura à UE como Estado independente. Na consulta popular de há dois anos, realizada em setembro de 2014, 55% dos escoceses votaram contra a independência, em grande parte para não pôr em perigo a relação do país com a UE. O cenário agora mudou radicalmente e cada vez mais o adeus ao Reino Unido parece ser a única forma de a Escócia voltar a dizer "olá" à Europa.
Mesmo assim, poderemos estar a falar de um processo para demorar pelo menos cinco anos. Além disso, os escoceses poderão ver-se obrigados a adotar o euro e a levantar uma fronteira com Inglaterra.
Os "truques" de Juncker
Em Bruxelas, durante o conselho europeu, a primeira-ministra escocesa fez os contactos que lhe competiam. Reuniu-se com Martin Schulz. "Ouvi e aprendi", disse o presidente do Parlamento Europeu, sem se alongar mais, depois do encontro com Nicola Sturgeon.
Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, também aceitou conversar com a chefe do governo escocês para ouvir os seus argumentos, mas sublinhou que nem ele nem Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, "iriam interferir no processo britânico".
Alguns países consideraram que a decisão de Juncker, ao aceitar encontrar-se com Sturgeon, era uma atitude provocatória com o objetivo de colocar pressão para que o Reino Unido acelere o processo de retirada. "É uma provocação. Ele não pode forçar os britânicos a submeter a notificação, por isso faz estes truques", afirmou um diplomata europeu citado pela Reuters.
O presidente da Comissão Europeia desvalorizou as críticas, sublinhando que "a Escócia tinha direito a ser ouvida em Bruxelas".
Donald Tusk, por seu turno, rejeitou encontrar-se com a primeira-ministra escocesa, alegando que este "não era o momento certo".
Nicola Sturgeon referiu que já estava à espera da assertividade espanhola. "Não é particularmente surpreendente ouvir essa postura inicial por parte de um país como Espanha. Nada do que ouvi hoje me surpreendeu. Estamos ainda numa fase muito inicial do processo", disse aos repórteres a primeira-ministra escocesa, acrescentando que saía satisfeita por perceber que havia vontade de ouvir o que a Escócia tinha para dizer.
Enquanto Sturgeon ia distribuindo charme diplomático em Bruxelas, em Londres, no Parlamento britânico, David Cameron insistia que os interesses do Reino Unido e da Escócia são os mesmos. "Temos de tentar negociar o melhor acordo possível e esse será também o melhor acordo possível para a Escócia." Houve quem não concordasse. "Não, pelo contrário. Nessa matéria o primeiro-ministro está errado", retorquiu Angus Robertson, deputado pelo Partido Nacional Escocês.
No referendo do brexit, ao contrário do Reino Unido no seu todo, que votou pela saída da UE, a Escócia - e também a Irlanda do Norte - deixou bem claro que quer continuar na Europa: 62% dos eleitores votaram a favor do bremain.
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