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1 de abr. de 2019

Nova Zelândia – A loucura dos Kiwi




FP, 01 de abril de 2019 








No mês passado, de acordo com pelo menos uma estatística houve 154 ataques terroristas em todo o mundo. Aqui está um resumo de alguns dos principais. O Talibã ceifou 23 vidas na província de Halmond Afeganistão; pelo menos 15 no distrito de Qaysar, Afeganistão; dez na província de Kunduz, Afeganistão; 20 em Bala Murghab, Afeganistão; 22 em um segundo ataque em Qaysar; e 65 no distrito de Sangin, Afeganistão. O EL assassinou oito pessoas em Idlib, na Síria; cinco no deserto de Anbar no Iraque; 16 em Jalalabad; sete em Makhmur, no Iraque; 17 em dois ataques separados em Cabul; e cinco no deserto da Síria. No Mali, a Al-Qaeda no Magreb Islâmico matou 32 pessoas em dois ataques separados. Na Síria, Ansar al-Tawhid matou 27. Em Moçambique, Ansar al-Sunna matou 13 pessoas em um ataque terrorista. Em três ataques terroristas no Mali, o Al-Shabaab ceifou 38 vidas no total. Um jihadista turco, Gokmen Tanis, atirou em quatro pessoas em um bonde de Utrecht. E um homem chamado Brenton Tarrant matou 50 pessoas em duas mesquitas em Christchurch, na Nova Zelândia. 


Qual dessas coisas não são como as outras? 

Apenas um desses ataques não foi motivado por uma devoção ao Islã. Apenas um foi cometido por um único indivíduo agindo por conta própria e não como um membro de um grupo terrorista. E apenas um fez manchetes em todo o mundo e fez o país inteiro levar uma cimitarra as suas cabeças contra suas próprias liberdades. 

Certamente uma razão pela qual os neozelandeses enlouqueceram com os ataques às mesquitas, ocorridos em 15 de março, é que seu país está tão isolado geograficamente que pode parecer que são imunes aos problemas que assolam o resto do mundo. Outra razão é que os neozelandeses tendem a pensar em si mesmos como supremamente virtuosos, liberais e multiculturais. (Nos últimos anos, seu nível percebido de corrupção, segundo a Transparência Internacional, tem sido geralmente o mais baixo da Terra; em 2005, tornou-se o primeiro país na história a ter em todos os principais cargos políticos preenchidos por uma mulher). Além disso, enquanto o jihadismo e o terrorismo tem estado em alta no mundo ocidental estando em alta desde 11 de setembro, nós temos, por mais de um ano, sido poupados de incidentes jihadistas na escala, digamos, do ataque de Nice [França] em 2016 (86 mortos), do massacre do Manchester Arena em maio de 2017 (22 mortos), e o massacre de agosto de 2017 em Las Ramblas, em Barcelona (15 mortos). Memórias são curtas. Os gritos de Je Suis Charlie caiu no esquecimento depois de um único ciclo de notícias. 

Então talvez faça uma espécie de sentido bizarro que na Nova Zelândia, que nunca teve um 11 de setembro, um Atocha ou um Beslan, muçulmanos – não apenas aqueles mortos ou feridos no ataque de Christchourch, mas todos os muçulmanos, em todos os lugares – foram instantaneamente colocados no papel de vítimas. Talvez seja isso que tenha feito passar a estranha sensação, de que inúmeras mulheres neozelandesas deveriam cobrir suas cabeças em solidariedade, assim como a própria primeira-ministra Jacinda Ardern, que se sentiram movidas a abraçar o uso dos lenços – como se os eventos na Christchurch houvessem transformado magicamente o hijab de um símbolo brutal de subordinação do Islã em algo benigno para as mulheres. 

Mas havia mais. Três dias depois do massacre, foi declarado ilegal que os cidadãos da Nova Zelândia possuíssem uma cópia do manifesto do terrorista, que ele postou online antes de iniciar sua matança. David Shanks, que detém o título de chefe de censura no Escritório de Classificação de Cinema e Literatura, ordenou que os neozelandeses que tinham impressões do manifesto os destruíssem sob pena de até dez anos de prisão e multa pesada. Cinco dias depois após o massacre, além disso, Ardern anunciou uma mudança nas leis de armas do país: “Todas armas semiautomáticas usadas nos ataques terroristas” foram oficialmente banidas. 

Além disso, como o psicólogo e professor canadense Jordan Peterson havia sido fotografado com um homem com uma camiseta dizendo “tenho orgulho de ser islamofóbico”, a Whitcoulls, uma rede de livrarias neozelandesas, removeu seu best-seller atual: 12 Regras para A Vida de suas prateleiras. The New Zealand Herald relatou que a camiseta do homem também incluía “outros comentários depreciativos sobre os muçulmanos”, na verdade, o restante do texto da camiseta consistia em uma lista de fenômenos associados ao Islã, como pedofilia, estupro, escravidão e espancamento de esposas, tribunais da Sharia, ataques terroristas, taqiyya, antissemitismo e mutilação genital feminina. Estes não são “comentários depreciativos”, escusado será dizer; são aspectos reais do Islã. Mas depois do atentado da Christchurch, considerou-se extremamente inadequado dizer isso. 

Havia outra coisa que seria visto como desagradável de se trazer átona depois do massacre. Em 2014, dois grandes sites de notícias da Nova Zelândia relataram que Christopher Havard – um australiano que se converteu ao Islã, mudou seu nome para Saleem Khattab, e que havia sequestrado ocidentais no Iêmen em 2012 e foi morto em um ataque de drones nos Estados Unidos em novembro de 2013 – ele tinha, segundo os seus pais, sido “introduzido ao islamismo radical na mesquita Al-Noor em Christchurch”. Al-Noor foi uma das mesquitas atacadas em 15 de março; a outra era o Linwood Islamic Center. Até onde eu soube, nenhum órgão de mídia na Nova Zelândia, ou em qualquer lugar do planeta, falou sobre Havard desde os assassinatos cometidos na Christchurch – nem mesmo os sites que originalmente citaram seus laços com a mesquita Al-Noor. Pelo contrário, enquanto um dos sites que mencionou a Havard manteve seu artigo de 2014 online, o outro – Stuff.co.nz, o maior site de notícias do país – parece tê-lo derrubado após o massacre (embora ainda seja acessível nos arquivos da Internet). 

Depois, há isto: em 23 de março, a primeira-ministra Ardern discursou em uma vigília memorial na maior mesquita da Nova Zelândia, a Masjid e Umar, localizada em um subúrbio de Auckland. Sua aparição foi amplamente divulgada, assim como as coisas brilhantes que o presidente da mesquita, Ahmed Bahmji, tinha a dizer sobre ela. “Sua voz estava triste”, notou a Radio New Zealand, “enquanto ele lembrava como ela havia coberto a cabeça toda vez que visitava um espaço sagrado”. Louvando sua “humildade e moralidade”, Bahmji disse a ela: “Estamos eternamente gratos pelo dia em que nossos corações foram tocados, você olhou diretamente para nós.. e nos falou de uma maneira que restaurou nossos corações, restaurou nossa fé e restaurou nossa comunidade”. Ardern, que usava um hijab para a ocasião, declarou-se “humilde”. 

Foi um dia movimentado para o chefe da mesquita: no mesmo dia, Bahmji participou de um comício em Auckland, onde disse a uma multidão que o massacre da Christchurch havia sido obra do Mossad, a agência de inteligência de Israel, bem como de várias “casas de negócios sionistas”. Ao contrário das palavras fulminantes de Bahmji na mesquita, os comentários antissemitas que ele fez no comício receberam pouca ou nenhuma notificação internacional, e a mídia nacional da Nova Zelândia pareceu ter tentado manter eles ocultos, sentindo-se obrigada a cobri-los somente alguns dias depois, quando a embaixada de Israel entrou com uma queixa. 


Finalmente, esta última sexta-feira veio o Serviço Nacional de Recordações oficial. A ordem de serviço incluía discursos da primeira-ministra, do governador-geral e dos líderes da comunidade muçulmana neozelandesa, além de uma – segundo ele – estrela internacional: ninguém menos que Yusuf Islam, ex-Cat Stevens, que cantou sua música “Trem da Paz”. Sob essas circunstâncias, é claro, seria grosseiro lembrar que, uma vez, Stevens, ou Islam, ou (para chamá-lo pelo nome de nascimento) Steven Demetre Georgiou, tinha sido um franco defensor do Fátua contra Salman Rushdie, e que ele tinha sido ordenado a deixar Israel depois de ter supostamente doado uma quantia grande para o Hamas, e que sua entrada nos Estados Unidos tinha sido negada por seus supostos laços terroristas. Afinal de contas, quem ousaria falar de assuntos tão desagradáveis quando toda a Nova Zelândia esteve unida em perfeita harmonia, para abraçar o belo mito da inocência muçulmana? 

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