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24 de out. de 2024

Cientistas revivem atividade cerebral em porcos uma hora após a morte — o segredo está no fígado




ZMSC, 23/10/2024 



Por Tibi Puiu 



Nova pesquisa revela como o fígado pode ajudar a proteger o cérebro de danos após a parada cardíaca.

Quando o coração de alguém para, os médicos correm para reiniciá-lo. Mas mesmo que tenham sucesso, o cérebro muitas vezes sofre as consequências. Apenas alguns minutos sem suprimento sanguíneo são suficientes para causar danos irreversíveis ao cérebro do paciente.

Agora, um novo estudo sugere que um herói improvável — o fígado — pode proteger o cérebro de danos graves após uma parada cardíaca. Pesquisadores na China conseguiram reviver a atividade cerebral em porcos quase uma hora após a circulação ter cessado. Essa conquista foi possível ao integrar o fígado ao sistema de suporte à vida.

Essas descobertas podem ampliar a janela crítica para ressuscitar pacientes com parada cardíaca, o que pode, eventualmente, melhorar as taxas de sobrevivência humana.

Estudando a Parada Cardíaca

A parada cardíaca interrompe o fluxo sanguíneo para o cérebro, levando a uma queda de oxigênio e nutrientes, processo conhecido como isquemia. Em poucos minutos, as células cerebrais começam a morrer. Por isso, os médicos têm apenas uma janela estreita para a ressuscitação bem-sucedida após uma parada cardíaca. Paradas cardíacas súbitas afetam centenas de milhares de pessoas anualmente na Europa e nos EUA, com taxas de sobrevivência ainda baixas.

Mas uma nova pesquisa, liderada por Xiaoshun He, da Universidade Sun Yat-Sen, na China, mostrou que o fígado pode desempenhar um papel surpreendente em estender essa janela.

No estudo, os pesquisadores usaram cérebros de 17 miniporcos tibetanos para explorar os efeitos da isquemia hepática — quando o fígado é privado de sangue — na recuperação cerebral após uma parada cardíaca. Os cérebros dos porcos foram colhidos e conectados à perfusão normotérmica cerebral (NMP), um sistema de suporte à vida.

Os cérebros dos porcos foram divididos em diferentes grupos, cada um submetido a diferentes níveis de isquemia. Um grupo, por exemplo, envolveu o fígado do porco conectado ao NMP, enquanto outro grupo experimentou apenas isquemia cerebral.

Os pesquisadores simularam condições de parada cardíaca para investigar como os cérebros desses animais respondiam com ou sem o suporte do fígado durante os esforços de ressuscitação. Cada cérebro de porco foi submetido a 30 minutos de isquemia aquecida. Em seguida, os pesquisadores tentaram reviver os órgãos usando um sistema de perfusão mecanizado.

A conexão cérebro-fígado

Os pesquisadores encontraram diferenças gritantes na recuperação cerebral dependendo se o fígado foi incluído na configuração de perfusão. Sem suporte hepático, os cérebros mostraram sinais claros de sofrimento: inchaço, aumento de dano celular e perda de atividade elétrica após algumas horas de perfusão. Esse resultado foi típico de cérebros sofrendo de lesão de isquemia-reperfusão, onde os tecidos, após serem privados de oxigênio, são sobrecarregados pelo estresse oxidativo após a reintrodução do fluxo sanguíneo.

Por outro lado, os cérebros conectados ao sistema de perfusão assistida pelo fígado se saíram significativamente melhor. Nesses casos, o fígado pareceu proteger o cérebro dos piores danos. Não apenas o inchaço cerebral foi menos pronunciado, mas a atividade eletrocortical — medida por EEG — também foi restaurada e mantida por até 6 horas. Essa atividade elétrica, que envolveu ondas alfa e beta, é um marcador da atividade cerebral funcional.

Os cérebros assistidos pelo fígado também mostraram níveis mais baixos da proteína S100-β, um marcador para lesão neural, em comparação com cérebros perfundidos sem suporte hepático. Neurônios em áreas-chave como o córtex e o hipocampo estavam visivelmente mais saudáveis, com menos danos ao tecido.

Tudo isso sugere que o fígado desempenhou um papel protetor durante o processo de reperfusão.

Por que o fígado fez tanta diferença?

O papel do fígado na proteção do cérebro parecia derivar de suas funções metabólicas e anti-inflamatórias. Quando o fígado estava presente no circuito de perfusão, ele continuava produzindo moléculas metabólicas vitais. Isso inclui corpos cetônicos, que o cérebro pode usar como uma fonte de energia alternativa quando a glicose é escassa.

Além disso, os pesquisadores descobriram que genes relacionados à morte celular e respostas imunes eram mais ativos em cérebros sem suporte hepático. Em contraste, cérebros perfundidos com um fígado mostraram padrões de expressão genética que eram mais propícios à sobrevivência e recuperação do cérebro. Essas descobertas sugerem que o fígado modera a inflamação no cérebro, ajudando a reduzir lesões secundárias causadas pela infiltração de células imunes.

Uma janela de oportunidade para ressuscitação

Em seu estudo, os pesquisadores também testaram por quanto tempo o cérebro poderia suportar isquemia quente antes que danos irreversíveis ocorressem. Notavelmente, quando o fígado estava presente, os cérebros podiam se recuperar mesmo após 50 a 60 minutos sem fluxo sanguíneo. Essa descoberta contrasta com as visões tradicionais de que o cérebro pode tolerar apenas 5 a 8 minutos de isquemia antes de sofrer danos permanentes.

Essas descobertas ressaltam o papel potencial do fígado em terapias pós-parada cardíaca. Embora muito do foco na ressuscitação tenha sido no coração e no cérebro, o fígado não deve ser ignorado.

Sistemas artificiais de suporte hepático, do tipo que muitos pacientes com insuficiência hepática já usam, poderão um dia ser adaptados para proteger o cérebro durante e após uma parada cardíaca.

Esses resultados não apenas desafiam as ideias existentes sobre a vulnerabilidade do cérebro à privação de oxigênio, mas também oferecem novas esperanças para terapias que podem melhorar a sobrevivência e a recuperação de pacientes com parada cardíaca.

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Fonte:https://www.zmescience.com/science/news-science/scientists-revive-activity-in-pig-brains-an-hour-after-they-died-the-key-lies-in-the-liver/ 

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