FIF, 31/10/2022
Por Marc Cervera
31 de outubro de 2022 --- A Rússia suspendeu oficialmente sua participação no corredor alimentar do Mar Negro, que ofereceu aos mercados algum alívio de preços nos últimos meses e aumentou a segurança alimentar em todo o mundo. De acordo com as autoridades ucranianas, o corredor mostrou pouco movimento recentemente, pois mais de uma centena de embarcações ficaram presas em uma fila aguardando inspeção.
“O secretário-geral [da ONU] está profundamente preocupado com a situação atual da Iniciativa de Grãos do Mar Negro”, diz Stéphane Dujarric, porta-voz da ONU, o que levou à decisão de Antonio Guterres de adiar em um dia seus planos de viajar para Argel (Argélia) para a Cimeira da Liga Árabe.
“O secretário-geral continua engajado em intensos contatos visando o fim da suspensão russa de sua participação na Iniciativa de Grãos do Mar Negro. O mesmo compromisso visa também a renovação e plena implementação da iniciativa para facilitar as exportações de alimentos e fertilizantes da Ucrânia, bem como remover os obstáculos remanescentes às exportações de alimentos e fertilizantes russos”, destaca.
“A decisão da Rússia de suspender a participação no acordo do Mar Negro coloca em risco a principal rota de exportação de grãos e fertilizantes muito necessários para enfrentar a crise alimentar global causada por sua guerra contra a Ucrânia. A UE insta a Rússia a reverter sua decisão”, acrescenta Josep Borrel, alto representante da UE para Relações Exteriores e Política de Segurança.
De acordo com a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, o acordo ajudou a movimentar oito milhões de toneladas de alimentos.
A preocupação com os preços do trigo
Os preços do trigo já subiram 1,5% em setembro, após meses de queda nos preços das commodities devido à “maior incerteza sobre a continuação da Iniciativa de Grãos do Mar Negro”, segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação.
Os preços futuros do trigo saltaram com a notícia do fim do corredor alimentar, com os preços futuros do trigo da Chicago Board of Trade subindo mais de 6% hoje na abertura do horário de negociação do mercado.
No entanto, o fim dos corredores de alimentos pode oferecer algum alívio aos comerciantes de óleo vegetal, já que o Índice de Preços de Óleo Vegetal da FAO atingiu em setembro seu preço mais baixo desde fevereiro de 2021, com grandes estoques afligindo os produtores.
Suspensão não retirada?
A agência de notícias russa Tass informa que a Rússia ainda precisa decidir se retirar totalmente do acordo, que termina oficialmente em 19 de novembro, se não for prorrogado. Putin questionou o uso pacífico dos corredores de alimentos após o ataque à Ponte do Milênio da Crimeia no início deste mês – em um território controlado pela Rússia.
A Rússia também critica que a maior parte das exportações de alimentos foi para a Europa, com Putin alegando que os países que precisam urgentemente de ajuda não se beneficiam muito do corredor comercial – os países africanos receberam menos de 20% das exportações de alimentos.
Em setembro, o Centro de Coordenação Conjunta (órgão que supervisiona o funcionamento do corredor alimentar) revelou que os países de baixa renda receberam 27% dos alimentos. Desses países, o Egito obteve 9% dos grãos e outros alimentos, seguido pelo Irã e Índia (4% cada), Bangladesh, Quênia e Sudão (2% cada) e Djibuti, Líbano, Somali e Iêmen (1% cada).
Os dados mais recentes da ONU, atualizados hoje, colocam a Espanha como o maior vencedor do corredor alimentar, recebendo 1,8 milhão de toneladas de alimentos, seguida pela Turquia com 1,3 milhão de toneladas, China com 906.300 toneladas e Itália 860.300 toneladas.
O Egito, em comparação, recebeu 428.800 toneladas de alimentos do corredor alimentar.
Fornecimento de fertilizantes a tempo
A ONU estima que a queda dos preços nos últimos meses, em parte devido aos corredores alimentares, impediu que “100 milhões de pessoas caíssem na pobreza extrema”.
“Se alimentos e fertilizantes não chegarem aos mercados globais agora, os agricultores não terão fertilizantes na hora certa e a um preço que possam pagar quando a temporada de plantio começar, colocando em risco as colheitas em todas as regiões do mundo em 2023 e 2024, com efeito dramático sobre a produção de alimentos e os preços dos alimentos em todo o mundo. A atual crise de acessibilidade se transformará em uma crise de disponibilidade.” diz Guterres.
Na mesma linha, o Programa Mundial de Alimentos alertou para uma iminente crise de disponibilidade em 2023, alertando que a crise alimentar pode não ter atingido seu pico.
O líder da ONU está pedindo a todas as partes que continuem enviando alimentos pelo corredor de alimentos, enquanto reafirma seu “compromisso inabalável” de tentar fazer com que os alimentos da Ucrânia e da Rússia cheguem aos mercados globais “na velocidade e preço necessários para evitar uma crise alimentar global e garantir a segurança alimentar”.
“Governos, companhias de navegação, comerciantes de grãos e fertilizantes e agricultores de todo o mundo estão agora procurando clareza sobre o futuro”, conclui.
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