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15 de abr. de 2016

Cenas de Guerra Fria entre caças russos e 'destroyer' americano

 






DN, 15/04/2016.





Por Abel Coelho de Morais





Incidente teve "agressividade como não víamos há muito", disse porta-voz dos EUA. Casos têm-se multiplicado desde 2014.

Dois caças-bombardeiros Sukhoi Su-24 realizaram uma série de voos rasantes junto ao destroyer americano USS Donald Cook em águas internacionais do mar Báltico quando o navio viajava da Polónia para a Lituânia, com um helicóptero daquele primeiro país a bordo. Os voos sucederam na segunda e terça-feira e um deles "simulou um ataque direto" ao navio, tendo o Su-24 passado a pouco mais de nove metros da proa, revelou ontem um porta-voz militar dos EUA.
Para este porta-voz, as ações russas revestiram-se de "uma agressividade como não víamos há muito" e "encerram o potencial para originar uma desnecessária escalada de tensões". Por seu lado, o comandante do navio, Charles E. Hampton, declarou que as manobras dos aviões russos não corresponderam aos "padrões internacionais e incompatíveis" com as regras de conduta em águas internacionais. Para o porta-voz do Ministério da Defesa russo, Igor Konashenkov, "foram observados todos os procedimentos de segurança", justificando a atuação dos Su-24 com a "proximidade operacional da base naval russa no Báltico". Esta encontra-se situada no enclave de Kalininegrado, entre a Lituânia e a Polónia, tendo o incidente ocorrido a 70 milhas náuticas (129 quilómetros) da base.



O navio americano, capaz de operar em ambiente de guerra radioativa, química e bacteriológica, tentou estabelecer contacto com os russos, que permaneceram em silêncio. O incidente ocorreu num momento de relações tensas entre a Rússia e a NATO na sequência da guerra no Leste da Ucrânia e de um comportamento de Moscovo considerado agressivo, nomeadamente pelos países do Báltico e Polónia.

Num total foram efetuadas 12 passagens rasantes pelos aviões russos, somando-se no segundo dia a presença de um Kamov-27, que passou sete vezes junto do destroyer americano, fazendo múltiplas fotografias. O incidente é o mais recente de uma longa lista de escalada de tensões remanescente da Guerra Fria, com a Rússia a revelar uma presença mais assertiva nas regiões dos mares do Norte e do Báltico, no mar Negro e no Ártico, assim como ao longo do Atlântico. Um desses primeiros incidentes envolveu igualmente o Donald Cook e sucedeu em abril de 2014, pouco depois de o navio ter chegado à base de Rota, no Sul de Espanha, no quadro do sistema de defesa antimísseis balísticos. O navio vogou então para o mar Negro pouco depois da anexação da Crimeia pela Rússia e antes da intensificação dos combates no Leste da Ucrânia. Então, o Donald Cook foi sobrevoado por um avião de combate russo.


Entre muitos outros casos sucedidos nos últimos dois anos, no final de outubro de 2014, em duas circunstâncias distintas no espaço de poucos dias, F-16 portugueses intercetaram aviões de combate russos sobre o Atlântico, no espaço aéreo sob responsabilidade nacional. Num dos casos, numa área adjacente ao espaço utilizado pelos voos comerciais na aproximação a Lisboa. Ainda envolvendo F-16 portugueses, a 22 de outubro do mesmo ano, e aparelhos dinamarqueses, estes intercetaram um Il-20 que entrara no espaço aéreo estónio, forçando-o a retirar. Antes, voara durante quatro horas ao longo de espaço aéreo sob a jurisdição de países da NATO.

Em todos os casos, os aviões russos não transportavam qualquer tipo de armamento, condição indispensável para não serem, por sua vez, atacados. Os meios de vigilância eletrónica permitem detetar qual o tipo de armamento a bordo de uma aeronave, o que originaria uma resposta automática.

Num plano distinto, a Suécia desencadeou uma caça a um submarino, alegadamente russo, entre 17 e 27 de outubro de 2014 que estaria a atuar nas suas águas territoriais. Moscovo tentou ridicularizar as acusações de Estocolmo. No total, em 2014, há registo de 39 incidentes, a maioria protagonizados por aeronaves no Báltico e Norte da Europa.

O incidente, que segue um padrão idêntico aos sucedidos no período da Guerra Fria, levou a Casa Branca, através do porta-voz Josh Earnest, a lembrar a existência de um acordo - de 1972 - a proibir "a simulação de ataques contra aeronaves e navios ou a realização de manobras acrobáticas", lê-se no documento assinado por representantes da União Soviética e dos EUA.



Nota do editor


A Rússia está tentando responder ao que chama de avanços insidiosos da OTAN, próxima demais do seu território, ou de suas fronteiras. O mais espantoso; e é aqui que eu chamo atenção de vocês, é o fato de que a Rússia não atacou a Turquia no episódio do caça que sobrevoava uma área delimitada. A Rússia simplesmente silenciou, e simplesmente puxou sanções contra o país islâmico, sem nada fazer em seguida. Como eu disse anteriormente: A briga entre a Turquia e a Rússia não passa duma luta assimétrica com um objetivo; que não é propriamente de se destruírem. Nem mesmo para a Rússia justificar o ataque a um membro da OTAN. No episódio do caça, a Rússia demonstrou somente o interesse em transformar aquele incidente em um chamariz para culpar os turcos pela atual situação na Europa, por conta do fluxo interminável de imigração, e de dinheiro, que a União Europeia tem que dar para os turcos diminuam o fluxo.

Fato é que, os turcos sim, cooperam com o terrorismo, e que as fronteiras turcas são como passarelas onde terroristas podem desfilar para cima e para baixo. A reticência de Putin para não retaliar o ataque da Turquia ao seu caça bombardeio foi à amostra mais gritante do quanto àquele incidente iria permanecer frio, por questões estratégicas. A Turquia no papel de membro da OTAN, e assim, no papel da própria OTAN já ajudou outrora os algozes russos em sua empreitada para enriquecer o urânio do Irã, o maior aliado da Rússia no Oriente Médio hoje, que no entanto, agora diz que os seus antigos aliados estão comprometendo a segurança da Europa, no caso os turcos. O fato de a Turquia ter ajudado o Irã enquanto membro da OTAN, a enriquecer o seu urânio prova que a luta é assimétrica, com o objetivo que não é propriamente de ambos se destruírem.
Vários políticos compraram a tese do Kremlin de que os seus irmãos das sombras, os turcos, estão comprometendo a segurança da Europa por meio de suas fronteiras cheias de aberturas, que é claro: Abertas propositalmente. Ao comprarem essa tese eles comprometem também o papel da OTAN, que imbecilmente permite que a Turquia faça negócios com o Irã enriquecendo o seu urânio para fins que, seguramente, não são pacíficos – enquanto, ao mesmo tempo, o país é moldado na propaganda russa como sendo o causador e principal culpado pelo caos na Europa, instigando assim, partidos, políticos e cidadãos europeus de que a presença da OTAN não se faz necessária, inclusive nos estados bálticos e na Ucrânia. Esse é o jogo do Kremlin, e diversos partidos e figuras políticas parecem ter comprado prontamente isto. O Kremlin conta com isso.

A Rússia teme perder mais países do antigo eixo para a União Europeia, e, por meio de sua influência dentro das legislações tem tentado adiar ao menos um dos que mais complicariam sua vida, no caso, os ucranianos.

Ao mesmo tempo em que os ucranianos veem a União Europeia como sua tábua de salvação, os países ocidentais repudiam quaisquer novas adesões ao bloco, por conta exatamente da impopular política de portas abertas de Ângela Merkel, que indubitavelmente tem comprometido a segurança dos europeus, causando transtornos, de estupros a roubos e até mortes, no que outrora era uma Europa pacata e civilizada.

O fato de haver mais pretendentes para aderir ao bloco torna os europeus não só céticos, mas também antiocidentais. Muitos grupos “patrióticos” têm comprado à tese dum Ocidente imperialista e causador de problemas e, junto com uma retórica antiocidental da classe política dita “eurocética” isso se torna um tremendo lobby, não só contra a União Europeia, mas também contra a atividade ocidental na Europa, e, consequentemente, no Oriente Médio.
Vários políticos têm mostrado simpatias para com a ação russa no âmbito dessas crises, tirando de fora, é claro, os grupos ocidentais, a quem dizem ser os causadores dos problemas, para início de conversa. Por isso, adesões a essa altura da crise migrante seria como apagar incêndio com querosene. Para os europeus ocidentais, e em especial a classe política, a adesão de mais países ao bloco seria como aumentar o poder da União Europeia, inclusive para interferir militarmente nos países em crise, e também impor quotas controladas com a desculpa de que os novos aderentes estão diminuindo o número de imigrantes a qual devam comportar, e que, portanto, passa a ser licito cooperar. A Ucrânia tornou-se anátema por causa do vigor em querer fazer parte da União Europeia. Para os europeus isso é como querer apunhalá-los pelas costas, querendo dar mais poderes e garantias de que a União Europeia pode obrigá-los a receber mais refugiados.

A demonstração da reprovação dos europeus ao movimento de Maidan se deu pelo referendo na Holanda, sobre a renovação dos tratados para a adesão do país a União Europeia, onde os holandeses, instigados principalmente pela classe política de oposição a Bruxelas, mas também as próprias políticas do órgão decidiram dizer "Não" a renovação de compromissos do país com Bruxelas. A Rússia, por meio de sua máquina de propaganda e desinformação RT, entre outros, usa de artifícios para convencer da sua legitimidade em orientar o conflito. É por isso que, quanto mais a Ucrânia quer aderir ao órgão, mais os europeus querem vê-la fora, e menos das políticas de Bruxelas esperam ver. E na esteira dos possíveis aderentes está a Turquia, a quem consideram ainda pior, pois além de os ver tirando vantagem do sistema econômico e da zona de Schengen, ainda teriam que pagar para que mantenham as fronteiras seguras, ou seja, pagar para nada!

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